Causa raiz
A causa com consequências
que viraram causa
e teve mais consequências,
que foram tomadas por causa
e ainda mais consequências.
Tudo numa ininterrupta sequência
que obliterou a causa primeira,
agora já tão longe da consciência,
mas permeando a vida inteira.
Verdadeiro pano de fundo
no teatro do dia a dia,
mas invisível no sentido profundo
que se esconde na agonia.
Fala-se em raiz,
canção raiz, cultura raiz,
e esquecem da realidade atual e sua raiz
a causa raiz. ,
A raiz que está na causa de tudo isso
que a cegueira
não deixa ver
e que força a realidade
a acreditar o que não é e no que ainda vai ter.
Com muita pieguice, pequenez,
ideias chinfrins, valores discutíveis,
estamos nos jogando fora cada vez,
onde vamos com passos sofríveis?
Fazendo causa e consequência,
atolando na ignorância e escuridão,
fazendo o presente sem consciência
uma euforia em ação e reação?
Com o passar do tempo fica longe a possibilidade
de identificar a causa raiz
tal o emaranhado existente na realidade.
Desafio até para os pensadores,
bons intelectuais e cientistas
cuja quantidade diminui a números atormentadores.
Difícil emaranhado é o cipoal de causas e consequências
que embaraçam a visão da realidade de aparência desconcertante. A análise
superficial leva à aparência de caos e desordem, visão compartilhada pela
maioria e por idosos, que não podendo explicar o cenário, recorrem a ligeiros
comentários sobre o antigamente e o agora em decepcionante e enganosa impressão
degenerativa.
No entanto, a realidade em continua construção tem a
tendência de objetivar o melhor, porque o Mal nunca vence, embora nunca se
saiba por quanto tempo fará o durante de sua permanência. O processo implica
resiliência por parte de várias gerações me trânsito.
Se compararmos qualquer setor ao longo da História,
seja por dados ou fotos, tudo tem melhorado, nada do antigo deixou de ser um
tijolo na construção de alguma realidade melhor. Mas é o durante que precisa
ser aguentado, pois é a agitação, o aparente caos, a confusão que não permite
identificar o que está sendo edificado. Tudo parece a construção de um prédio
na fase de escavação, a fase de fundações em que os pedreiros e passantes não
podem vislumbrar o que está sendo construído. Diante a aparente desordem, se
questionados, nada podem identificar ou esclarecer muito menos explicar, muito
mais se considerarmos o baixo nível de discernimento decorrente da falta de
esclarecimento advindo da falta de boa educação formal.
E nesse contexto, qual a contribuição das redes sociais
e mídia em geral para a formação da ideia de confusão, muito intoxicada pelo sensacionalismo e uso de tendências
políticas e ideológicas? Tudo faz um
caleidoscópio, de realidades distintas e inacessíveis embaçando a visão
popular, ocupando nossos intelectuais midiáticos, desviando de uma análise
filosófica e mais bem estruturada, mas privilegiando escolhas de temas diários
e favorecendo bois de piranhas mesmo porque tudo que aparece nas milhões de telas
compõe um enorme desfile de pontas de iceberg , suscitando narrativas
apressadas e jogos de palavras com muita manipulação.
Quanto dessa realidade tendenciosa que contrasta com a
realidade da vida individual a
contamina? Como condiciona a opinião pessoal e coletiva?
Mas isso está longe de ser causa raiz de qualquer
realidade. Tampouco causa do circo de impressões, boas ou más, pois em verdade,
milhares de pessoas já viraram as costas para tudo isso, trocando de canal,
desligando o celular ou negando diálogo, para manter sua opinião que é sempre uma defeituosa
síntese de que nada leva a nada, tudo dá em pizza, depois de jogadas
processuais, anulações por erros formais ou negociatas político-partidárias.
Derretida a ponta do iceberg, nada mais aparece e está salva a aparência,
passando a ser um mero detalhe.
A realidade pessoal verdadeira continua, é feita e
vivida por todos na individualidade da carestia. Tal realidade não tem pausa,
não é desligada nos fins de semana e feriados. Só para mencionar, sendo atual,
uma causa que vem se desenrolando há mais de 20 anos é o desmotivar o
empreendedorismo. Não é causa raiz, é consequência e gera muitas causas e
consequências. Ninguém é obrigado a empreender, pode fechar a empresa e
simplesmente cruzar os braços.
E num país assim em construção, quem e como é analisada
tal realidade, que aparece em estatísticas, divulgadas para as mesmas pessoas
que são incapazes de discernir ou para quem o discernimento em nada contribui
para o bolso? E se houvesse possibilidade de análise profunda em busca da causa
raiz ou de qualquer outra, o que fariam as pessoas com as conclusões, num mundo
em que quem discorda é cancelado, debochado, rejeitado, onde nem há lugar para
um debate mais estruturado e onde pessoas mantém diálogos superficiais que são
meros monólogos radicais, inflexíveis, intolerantes, impacientes com palavras
surdas e rápidas.
E a causa raiz? Será uma ou serão várias? Seriam
históricas, educacionais, culturais, econômicas? Com que método penetraríamos
na quiçaça dominante para chegar à origem?
Talvez o país tenha perdido suas causas, todas, antigas
e atuais, e a causa raiz tenha ficado ultrapassada e já impossível de ser
erradicada.
A causa raiz passou a fazer parte do DNA do país? Não
há mais tempo para eliminá-la. No tempo atual mal se consegue lidar com as
consequências-causas que estão fazendo a realidade ficar cinza para
muitos.
E quem sabe da causa raiz, não a revela mais, pois a
nossa democracia midiática nada aceitaria e o cancelamento seria imediato.
Todavia, tal sabedoria não se apaga da mente do
pensador que deve se contentar em poder explicar toda a maçaroca da
atualidade para si mesmo. O nó é górdio. A vida está embrulhada no pacote e a
população exposta ao que vem construindo. Direita ou esquerda e ninguém vai
para frente. Muita energia para um passo tímido, mas o país vai indo pelo
material. Muitas avenidas novas e iluminadas. Espero que em algum lugar a causa
raiz não aflore com tanta periculosidade, interrompa tudo e revele o que foi há
longo tempo esquecido sendo prioritário.
A fase é a mesma que outras terras já passaram, muita
agitação e pouca estabilidade, típico do país ex-colônia ainda em construção.
Realidades se cruzam e se sobrepõem, dando ideia de devaneios e desesperanças,
mas há um rumo sendo seguido. Territorialmente somos uma das maravilhas do
Universo, mas ainda enfrentamos o fator humano e suas mazelas, mas é uma fase
de várias décadas. Já fomos bem piores, muito piores. O durante e sua lentidão
é que cria ansiedades, que só podem ser vencidas pela aceitação. Temos uma
causa raiz e muitas gerações ainda a terão como cenário de fundo. Aguentemos.
Odilon Reinhardt
3.8.25