sábado, 1 de outubro de 2016

As ruas de tantas faces.



Blog  1.10.2016 


 





                                         As ruas de tantas faces.


Andando pela rua da cidade, pode-se ver um povo.

Rua de feições
preocupadas, cansadas,
estressadas, enfezadas,
rua de muitas visões.

Rua de caras
estafadas, enrugadas,
tristes, perturbadas,
rua de caras secas.

Rua de rostos
fechados,cabeças baixas,
silenciados, amassados,
rua de olhos desgostosos.

Rua de semblantes
carrancudos, soturnos,
uniformizados, massificados,
rua de pessoas de olhares distantes.

Rua de faces
soterradas, desfiguradas,
rotineiras, infernizadas,
rua de calçadas e seus trastes.

E tantas são as ruas
com almas e suas fachadas,
indicando as realidades suas.

Tantas faces caladas
escondendo situações,
tantas, brutalizadas.

Tantos são os vulcões
por trás de tantas pessoas;
todos prestes a fazer suas explosões.

E assim vão as pessoas pelas ruas,
carregando suas faces pesadas,
com expressões caladas e não só suas.

Iludidas, dissimuladas, maquiadas, escondidas,
enfeitadas, falsas, vingativas, ameaçadas,
humilhadas, diminuídas, enfeitiçadas, emocionadas,
ressecadas, encurraladas, intrigadas.

Assustadas, afogadas, frustradas, deprimidas,
irritadas, insatisfeitas, contrariadas, reprimidas,
fechadas, contraídas, enlutadas, apertadas,
sofridas, nervosas, surpreendidas, desanimadas.

Desesperadas, contrariadas, aterrorizadas, iradas,
escravizadas, encarceradas, enganadas, inseguras,
instáveis, espantadas, abatidas, desamparadas,
intimidadas, desiludidas, carentes, alarmadas.

Satanizadas, condenadas, feridas, horrorizadas,
silenciadas, desenganadas, chocadas, anestesiadas,
dormentes, embrutecidas, enfraquecidas, sombreadas,
constrangidas, fingidas, endividadas, escancaradas.

Angustiadas, endiabradas, infernizadas, empalhadas,
amedrontadas, fingidas, judiadas, descontroladas,
descontroladas, desgovernadas, inchadas, embatatadas,
oprimidas, culpadas, inferiorizadas, vitimizadas, estarrecidas.

Enfurecidas, enciumadas, orgulhosas, invejosas, enciumadas,
desequilibradas, bloqueadas, manipuladas, paralisadas, congeladas,
patéticas, afobadas, estiradas, superadas, esquecidas, anônimas,
entristecidas, apagadas, suprimidas, violentadas, esticadas, roubadas.

Desencorajadas, desacreditadas, envelhecidas, envergonhadas,
afrontadas, desafiadas, reveladas, desenganadas, desfiguradas,
alienadas, compenetradas, isoladas, rebaixadas, fracassadas,
atiçadas, desafiadas, agredidas, desaprovadas, rejeitadas.

Espezinhadas, entregues, caídas, apressadas, violentadas,
condicionadas, uniformizadas, dominadas, maltratadas,
empobrecidas, esvaziadas, classificadas, rotuladas, asfixiadas,
desclassificadas, arrasadas, indignadas, desconfiadas. 

Ruas da cidade,
corredores do dia à dia,
a realidade.

Subidas e descidas,
ladeiras da crise,
almas desiludidas.  

Poucas faces alegres, satisfeitas, descontraídas,
sorridentes, felizes, abertas, animadas, contentes,
livres, iluminadas, brilhantes, claras, inspiradas,
entusiasmadas, positivas.

A grande maioria que vai pela rua
tem caras estafadas, preocupadas, apavoradas,
decepcionadas, ressabiadas, arrependidas, enrugadas,
pasmadas, aflitas, de natureza tosca e crua.

E na rua de tantas caras há um silêncio,
barulhento, profundo em sua mensagem,
uma insatisfação maior que qualquer estipêndio.

Já houve períodos desse silêncio antes,
tão perturbador que acabou com um Governo,
continua agora com as consequências de antes.

Esta infindável crise, esta perpétua depressão,
o país encalhado, a Pátria enrolada,
um Governo materialista que comprometeu a Nação.

Mas não é de agora,
tudo é um processo de décadas
e piora a toda hora.

E assim vai a rua
em calçadas de vidas descalçadas,
expondo a verdade crua. 

Neste vai e vem,
vive-se com medo do humano
e há solidão no caminho de todo ninguém.

Casas e prédios com grades e alarmes,
cirenes e cercas de ferro e vidro,
todos fogem dos estranhos infames.

O vai e vem na rua do desencontro,
de cada bairro e vilarejo,
onde deveria haver alegria no alegre encontro. 

Tantas faces pensando em se esconder,
escorrem pelas ruas, encaram o Próximo como inimigo,
mas ali tudo se pode ler e entender.

O que vai na mente
deve estar num dos adjetivos acima,
e assim vai essa gente.  

Que país é este, onde há uma insatisfação patológica, comprometendo o corpo e a mente? Onde um ex-presidente diz abertamente que montou uma quadrilha para tirar 30 milhões da miséria?

Certamente, o ego de cada um faz parte disso e o Governo, materialista de primeira hora, só pensa que obras eleitoreiras poderão alavancar o processo de crescimento individual e coletivo de um modo totalitário de pensar ele ser o salvador paternalista que melhorará este carcomido estado de espírito. A Nação ficou e está ainda mais doente. A cura levará de 60 a 100 anos. É questão de maceração histórica, de evolução humana. Dificilmente os respingos da evolução de países mais avançados poderá fazer o doente melhorar subitamente e tampouco alguma solução virá da foice e do martelo ou qualquer de suas variantes imbecis. Nem um celular novo, uma estrada nova nem qualquer tecnologia material poderá amenizar as doloridas etapas do porvir até a cura numa geração futura. Gerações foram gastas no corte das matas e no estabelecimento do básico, tantas outras serão gastas até a civilização. 

Improvável que a psicologia de massa possa criar um circo tão fantasioso equivalente a um sofá de Lacan ou qualquer outro, a fim de tratar uma doença tal qual a do cachorro vira-lata , a qual não surgiu hoje, mas ao longo de décadas. Há crises neste país desde sua descoberta. A crise atual é só um estágio da crise histórica. Inegavelmente grave e com destino à violência maior.

A contrariedade sempre foi uma raiz; o ego pessoal e coletivo sua seiva. Nem ricos nem pobres estão satisfeitos. Por dentro há uma pobreza gritante, uma carência retumbante, uma insatisfação contaminante da mente. O sorriso é estérico, eufórico ou irreal e cínico. Poucos, muitos poucos livrar-se-ão de todo este perene clima desmotivado, mas violento.  

Muito embora a realidade de décadas tenha produzido faces tão amarguradas, os últimos culpados, ocupantes do Poder, construíram uma fantasiosa economia com inglório castelo de areia. Cegos pelo poder e pela ambição pessoal de ostentar e acumular riqueza pessoal, aproveitaram-se da carência nacional, da miséria do povo para saquear os cofres públicos. Falharam  horrorosamente e  mesmo assim ainda recebem a seu favor frases como “ é tudo parte de um espetáculo “, “ é uma estratégia ilusionista “ etc, etc. Tal risível discurso coloca a Nação na posição de idiota numa fantasiosa ópera do malandro.  

Fato é que a miséria nacional sempre foi bom discurso de oposição e desta vez serviu para alavancar a febre do doente, deixando-o prostrado em terra insegura. Mais uma vez usaram o povo. A demagogia e a fantasia eram cortinas para uma rapinagem de tamanho bilionário. E ainda tiveram o peito de dizer que era tudo democracia. Talvez fosse para eles, em seu fechado clubinho vermelho, onde o lema seria “ todo mundo poderá roubar igual e ficaremos no poder para sempre” , democrático , não?

Não deu certo, o dinheiro foi acabando. A casa foi caindo. Carniça no fim, urubus em trajeto de afastamento. Mas não queriam largar os ossos, não acreditavam que toda a fantasia estava no fim. De suas mansões e estilo de vida similares às das quichotescas e imaginárias “elite”,  muitos passarão algum tempo em espaços confinados minúsculos.

Resta perguntar qual o grau de participação de Governos nestas faces de tantos adjetivos ao início enumeradas. Faces dos populares e também dos ricos, que por si só expressam o ego contrariado de há muito tempo numa vida marcada pelo fisiologismo e muito pouco esclarecimento e consciência. Muita irritabilidade, impaciência, intolerância descamba para a hedionda violência crescente. 

Na verdade um paraíso para psicólogos, psiquiatras e psicanalistas que aproveitam a fartura de problemas, sem propor nada para a saúde coletiva da fazendola Brasil. Ninguém critica ou propõe nada contra o avanço do individualismo e do materialismo na terra da feirinha de eletrônicos.

Apesar da contribuição que a cultura política, os políticos e a administração da economia da fazendola possa ter contribuído para a expressão das faces das pessoas, não se pode negar que todas estas faces andam por aí, explodindo e fazendo clima na fila do banco, no assalto e nos homicídios, no arrombamento, na praça, nos locais de trabalho em empresas e escritórios, onde tradicionalmente já há um certo fascismo entre as pessoas, nas casas de família e em todos os locais da Pátria, arrastando os níveis de vida neste país.

Que medidas trarão alívio, mesmo que temporário, para dar uma chance a tais faces. Talvez um bom humor, um sorriso? Utopia ou realidade? Possibilidade ou improbalilidade?

A Constituição da República tem que cumprir sua missão e conseguir, através do Governo, uma realidade melhor. Com a Justiça Federal que acordou, com o Ministério Público que se libertou e com a Polícia Federal que deixou suas algemas, talvez com a limpeza na corrupção, tudo e qualquer cidadão comece a respirar ares novos e alguém possa sorrir; espero que antes disso,  parte das novas gerações não tenha sido totalmente contaminada a ponto de comprometer o seu próprio futuro. Difícil.

É necessário resgatar o imã do progresso pessoal e coletivo de modo sólido, real e verdadeiro. Nada de castelos de areia e embustes partidários eleitoreiros, fadados a dar uma vida de nobre a líderes pobres de cabeça.

A ausência da corrupção, dando ao cidadão a garantia de honestidade, justiça e seriedade já seria parte de um remédio para reduzir as caras amassadas. Seria já um avanço também para detonar a nivelação por baixo, esta mediocridade que avança no país e faz as pessoas contentar-se com o ruim, como o jogado fora, com a simplicidade tacanha.

Fé e esperança simples já não adiantam tanto. É necessário fé e esperança escoradas na educação, no crédito ao Bom, ao sábio, às ideias boas e inteligentes, algo positivo, progressista para variar.

Mas se não aproveitarmos o momento para irmos para a frente, continuaremos  no clima de frustração, de derrota, de negativismo, de esquerda de botequim, de recalque,  contestando os ricos e “as elite”, tendo como princípio os lemas como a vontade de não trabalhar, de ver o Tesouro como alvo de espoliação, de ver um cargo eletivo ou não no Governo como uma “oportunidade para se fazer”, de ver o Governo como ação entre amigos, de esconder erros de amigos para não manchar o partido no Governo, de  usar a mentira como modo de escamotear realidades etc, etc.

Teremos que, depois de 516 anos, começar do ano 1, aceitando que os impostos não caem do céu e que seu recolhimento forma a receita pública que deve ser usada por um Governo “ from the people, for the people, by the people “, conforme receita de Abraham Lincoln.

E um dia, o Brasil será então diferente, com políticos diferentes num país positivo, de gente com cara amiga, satisfeitas e realizadas, pelo menos na parte que compete ao Governo.  
                                                                     Odilon Reinhardt