terça-feira, 3 de julho de 2018

Mais uma vez, o nada de novo.





                                               
                                       
                                           Mais uma vez, o nada de novo.  

                                           

 3.7.2018.
Com o foco na bola, grande porcentagem da mídia, ocupa-se com o rendimento do pão e do circo e deixa o país viver um pouco sem a agitação televisiva, que cultiva e turbina a ansiedade do dia a dia.  Há uma pausa e a população parece poder respirar sem as diárias e intensas chuveradas de negativismo coletivo. As notícias espalha-brasa ou espanta-gato cessam por alguns dias e há uma aparente calma na intenção de incluir o país inteiro em realidades mais atrozes nos grandes centros. Pode-se pensar assim em condições normais. Mas agora pensar assim seria uma “capitis de minutio” de qualquer cidadão pensante. A realidade produz notícias ruins a toda hora, impossível escondê-las.

Esvaziada a bola, encerrado o circo, volta-se ao pleno cotidiano televisivo de agitação da audiência, restando opção de desligar a TV ou não. Na verdade a realidade foi substituída, desfocada, mas nada cessou. O tempo é só um, o dinheiro é que determina a prioridade e intensidade das notícias. Tais fatos já não se repetem em 2018, pois a bola não conseguiu o efeito de abstração. O noticiário continuou dividindo o lance com a bola, mostrando os dias recheados de corrupção, violência, ações do crime organizado, operações do tráfico, deficiências na infraestrutura e serviços públicos etc. O efeito pão e circo parece não ter mais o efeito de anestesiar a Pátria.

A realidade em que estamos, com TV ou sem ela, continua a produzir consequências.  As questões estruturais que foram negligenciadas durante décadas pressionam a Nação e cutucam a realidade. Tomar conta de tais questões é agora demorado, mormente quando não há dinheiro. A maior questão estrutural, coluna vertebral do futuro é a Educação. Qual a estratégia de nossa educação formal? No ano das eleições algum candidato apresenta um plano de reformulação do sistema educacional? Tudo leva a pensar que o programa de governo de cada candidato é ele mesmo. O programa é a estratégia para ganhar as eleições. Depois é que verá o que fazer, de acordo com a vontade e mando de seus financiadores.  

Pressionado pelos vários setores da sociedade, o Governo tem que resolver problemas acumulados e urgentes no saneamento, na mobilidade, no meio ambiente, na economia etc. e a Educação vai ficando de lado, sendo esquecida, pois, como imaterial produz efeitos no indivíduo e é facilmente reduzida a problema individual e jamais coletivo. 

E assim , o  “ Leviatã” criado está nos engolindo lentamente. É o “ Gargantua e Pantacruel” que vão devorar a vida aqui. O sinal vermelho está acesso há pelo menos duas décadas. Não é brincadeira. Os jovens estão desqualificados para o mercado de trabalho mais avançado. As providências estão sendo exigidas, mas como tomá-las? Há tempo? Pouco para semear e colher a médio prazo. Muito para semear agora e colher em décadas. Que partido político se interessa por isso?

Estamos doentes, atropelados pelo que não foi feito, investido e criado. Agora a falta da colheita está fazendo realidade cruel e a população vive na exigência, quer o que não foi plantado. Os defeitos materiais são fruto da questão imaterial, a Educação.

Por falta de educação formal, por falta de qualificação apropriada ao mundo atual mais avançado, podemos estar perdendo a sintonia, ficando defasados em mão de obra especializada e principalmente em mentes pensantes para ciência e tecnologia. Podemos estar sendo condenados mesmo a ficar como fazenda do mundo e a população obrigada a trabalhos manuais e braçais.  Os jovens talvez tenham que ir se habituando como horizonte mais curto, pouco dinheiro e um bom lugar para cortar frango e entregar pizza.

A miséria do país é tanta que nem os europeus vindos depois de 1870 conseguiram sair da vida sofrida do campo, são vítimas da falta de escolas e infraestrutura, mal sabem falar o Português, tendo preservado dialetos da língua que nem mais existem no país de origem. São os capiaus, os colonos  do século 21, cultuando uma Itália, uma Alemanha, Polônia etc. que não existe mais. O movimento MST é formado por quem?

Na mistura étnica e cultural com a qual vamos formamos essa idiossincrasia nacional, somos o Brasil como ele é hoje, resultante de políticas públicas desde 1500. Sem educação pública, deu no que deu, um arremedo de “Frankstein” do mundo moderno em termos de desenvolvimento humano e material. Somos feitos de retalhos, ora de fazenda de grande valor, ora de tecido de baixa qualidade.

Por belas e novas avenidas continuam passando a miséria e o sucesso, o desprovido de letras, o vazio de tudo, a mediocridade e os arautos do progresso material mascarados de excelência e autoridade. O celular está na mão de qualquer um na feira experimental de eletrônicos que virou o país. Os bens materiais estão acessíveis a qualquer um que tenha crédito. Mas a cabeça, como está a cabeça? O que ali passa? O que carregam os cidadãos de todos os naipes? Como escrevem, o que podem entender?

A insegurança de futuro, o horizonte distante e miúdo, a preocupação com o umbigo, a desesperança quanto ao progresso bem sedimentado, a visão miúda do aqui-agora fazendo o dia, a perda da noção do certo e errado, o descrédito quanto ao porvir. Tudo tem um vir de indagação, de dúvida e deixa o cidadão carregando sua cabeça pesada, atormentada, pronta para explodir tal é insegurança quanto a realização dos planos, desejos e projetos pessoais, todos condicionados e formatados pelos sonhos ali enfiados pelos estímulos de modelos de nível econômico, tendente a propiciar e satisfazer a vaidade , a aceitação  no social, o orgulho etc. O único ponto de segurança é que a pessoa continuará a ser contrariada; viverá neste tom e deve estar pronta para se defender a qualquer momento, pois aqui o Próximo virou rival e inimigo e competidor e ladrão e assassino. 

É o Brasil feito do fisiológico, cada vez mais pele, emocional, carne. A falta de Educação nega o desenvolvimento do intelecto, o esclarecimento e o progresso mental. Sem Educação, a realidade é feita do bruto, do básico, do grotesco e os relacionamentos são feitos do tosco encontro entre mundos selvagens.

A mão de obra vem carimbada com este estigma. É sem qualidade, sem adereços mentais. Em qualquer ramo do mercado, há desqualificação. Basta um aquecimento de algum setor e já se observa a falta de mão de obra. Os reflexos econômicos são funestos e limitadores. O país habituou-se a investir pouco, plantar pouco e quando precisa, colhe o que plantou na safra da Educação.

Habituou-se a ser pequeno, um país para poucos, de chances para poucos. Continuou a cultuar o “karma” de cão vira-lata, a copiar moda e modelo do negativismo e seguir ideais piores dos mundos do primeiro escalão. Se formos ficar neste padrão, teremos que nos habituar a ele, aceitar seus limites e não se arvorar em querer alcançar padrões de primeiro ou segundo mundo. É uma questão de viver a realidade, assumir-se: o pobre convicto e feliz; o bom-selvagem. A estrutura de poder que criou para o povo crenças dessa natureza deve estar feliz e sentindo-se realizado em sua missão; conseguiu embotar um continente inteiro. Prevalece o nivelamento por baixo, com máscara de humildade.

Passada a época da vida de euforia e falsa luminosidade, como reagirão os jovens atuais e os das gerações próximas quando descobrirem que muito do “ prometido pelo mercado” não lhes será inacessível? Que pressão, tal lapso de consciência poderá exercer, para quem desejar cumprir seus sonhos de consumo e constatar que não poderá fazer nada? Hoje planta-se no sentido de “prometer “ padrões e modelos de aquisição de bens que possam corresponder a um grau de “ felicidade” e inclusão ou ascensão social sem garantir os meios. Como será a colheita? Como estarão os índices de furtos e roubos? Que força terão as milícias e esquadrões do crime organizado?  É o culto do material como expressão da aparência e de um sucesso sem mérito algum.

Sem estudo, sem Educação de qualidade, tudo será mais difícil, mais inacessível e o ego estará sempre sendo contrariado, oferecendo a ira social, a raiva do não ter, do não saber, o ciúme e a inveja do não poder. O medíocre estará raivoso e revoltado, querendo vingança pelo estado em que ficou. A revolta terá como origem a situação pessoal, mas ficará mascarada na multidão e esta terá alguma bandeira descorada de alguma revolução fantasiosa.   

Certamente a incompreensão e o inconformismo serão fortes nas exigências sociais. Ninguém desejará saber das causas, mas exigirá remédios para as  consequências e governos da época estarão em situação difícil na busca de contentamento da população. Como terá evoluído nosso autoritarismo, intolerância, inflexibilidade quanto às diferenças de opinião, corrupção, prepotência, violência física e mental? Como será a evolução de nosso modo desonesto, brejeiro, corrupto de fazer negócios? 

As consequências de uma população, sem educação de qualidade, serão fatais para os negócios, os empreendimentos, para as políticas públicas, serviço público e privado, pois a base para a qualificação e progresso social não é feita de uma semana para outra, mas pelo menos em duas décadas. Nem tudo no futuro será cortar frango e cuidar do gado. Será cada vez mais exigido esclarecimento, discernimento, capacidade de entendimento e diálogo, bom senso, vontade de crescer.

Nossos avanços materiais esquecem o ser humano. Está visível que a quaisquer quilômetros da rua principal das grandes cidades encontramos realidades do Brasil de 1920 a 1950. A infraestrutura vai se esvaindo no distanciamento das cidades, mas mesmo assim é melhor do que nas décadas mencionadas, todavia o que chama a atenção é a condição humana, o pensamento, o grau de esclarecimento e qualificação da mão de obra. A Educação foi esquecida, abandonada. Máquinas mais refinadas poderão ficar paradas por falta de operadores ou técnicos de manutenção com maior frequência. Uma realidade a ser amplificada, pois hoje já há máquinas que ficam paradas esperando o técnico de manutenção que vem da Europa ou outro país. Há máquinas sofisticadas, doadas ou adquiridas, que nem chegam a sair da caixa por falta de mão de obra.   

Em 2018, há uma esperada eleição que seria esquina do tempo, mas nada. Os políticos não esboçam nenhum sinal de mudança; estão acomodados, jogando o mesmo jogo, as mesmas regras, o mesmo baralho velho e marcado. Não há planos novos que possam ser tomados com atenção; só palavras de faz de conta. A nossa evolução como sociedade tem sua manha, seu jeito. Estamos atrasados por que ficamos atrasados e é este o nosso passo, é esta nossa picada ainda para sair do mato da nossa cultura, sovada e assada desde 1500. O nosso aprendizado coletivo segue lento, com anos de avanço e anos de reprovação e assim prosseguimos em nossa História. Nosso subdesenvolvimento tem raízes coloniais e estigmas do rural e do selvagem e levará décadas e décadas para chegar à civilização plena. 

Mudanças de gestão poderão ocorrer, mas não de atitudes e de pensamento. Ainda levará décadas até a colheita, se hoje pudermos plantar algo de bom. E plantar é só na Educação. Poderemos continuar com obras para fazer propina, talvez agora com maior sofisticação em seu pagamento, mas elas só serão o material e nunca o espiritual para a mudança. A carroça de legumes que passa pela picada até a cidade pode passar por uma bela avenida, mas continuará uma carroça, um veículo de passeio ou será um caminhão de legumes, mas seu motorista continuará a ser o mesmo, com o mesmo comportamento tosco, autoritário, intolerante, inflexível, egoístico, violento, pronto para qualquer devaneio.

A vida continuará a produzir seres moralmente desqualificados para os setores da vida produtiva; a produzir cidadãos grotescos na aparência e no comportamento; a propiciar os negócios feitos com corrupção, desonestidade, eivados de má–fé, antiéticos, irresponsáveis e descomprometidos com o país, mas perfeitamente adequados ao umbigo de cada um.

E tal cenário social, certamente viverá momentos ainda mais intensos de contrariedade, violência, ações e reações egoísticas, fazendo com que o relacionamento pessoal seja mais violento e animalesco. E o rebanho está ficando velho, calejado, sem esperanças e sem nada para perder. Pessoas para as quais a verdade já silenciou na boca por falta de palavras, mas que pode embalar a mão de seus descendentes, já espoletas de revolta.  Cresce o desrespeito aos padrões de vida digna e inteligente. Aumenta o desrespeito às instituições e autoridades, aumenta a atuação dos meios de polícia. Há sinal pior de semente de má qualidade?  Uma sociedade onde a educação não é a prioridade para todos é regida pelo fisiológico, pela emoção, pela carne e isto não é um modo de vida de bons resultados. A estratégia melhor seria priorizar a educação como meio justo de “subir na vida”. Na falta ou negligência quanto a dar estímulos para que os jovens decidam adotar os estudos como meio de progresso pessoal, o que se pode esperar é descaso, depois revolta.

Hoje já se pode ver que qualquer um, a qualquer tempo e por qualquer razão, não descartado o devaneio, a loucura pessoal, pode pelo celular arregimentar seguidores para iniciar um ataque ao Próximo ou a uma instituição. Basta que o convite encontre respaldo na ira popular, estocada em razão de inúmeros problemas pessoais e coletivos e inicia-se uma crise sem precedentes. Com a  ansiedade provocada pela época atual, todos querem resultados rápidos, o que é impossível em muitos casos, principalmente na Educação.

Basta um “hoje tem quebra-quebra na rua tal...” e lá vai cada um fazer a multidão explodir, procurando mudar algo, por meios que não incluem a possibilidade de diálogo, mas, sim, vontade de desabafar sem nada resolver. 

Só a Educação de qualidade, com objetivos de formar seres livres e conhecedores da universalidade de conhecimentos, pode ajudar cada pessoa a pensar melhor, a ter metas superiores de vida, a desejar alcançar inteligência que possa ajudar a melhorar a vida e a convivência.  Sem Educação, só se conhece a mediocridade da manada e seus condicionamentos baixos e fisiológicos do animal, querendo sobreviver e entregando-se à manipulação, à falsa condução. Sem Educação não há valorização de ideais inteligentes nem de valores da Nação.

Na última ocasião de demonstração de descompromisso com a democracia e seus meios de debate, a desobediência civil, o desrespeito ao cidadão e sua família, vimos os sinais perigosos da mentalidade incendiária; cada um se sentiu mais perto do que deve ser países onde a gestão do Governo com erros estratégicos que levam ao desabastecimento, pobreza, agravamento de tudo. A má gestão da coisa pública pode, sim, levar ao caos, invasões, saques, crimes etc. E mais, levar o cidadão a ver no Próximo um rival e um competidor. É imperdoável a negligência, pois o tempo cobrará em vidas e no material o descaso com a Educação. Nenhum país consegue sobreviver dignamente sem ela. No mundo atual, um país pode aguentar por algumas décadas , mas logo ficará clara sua posição escravizada.

Difícil não recorrer a David Nasser que em 1963 escreveu, incrível “a indiferença do brasileiro do centro, do brasileiro acomodado, contemplativo, preso a um Brasil brasileiro, que não mais existe, certo de que Deus ainda é brasileiro, convencido de quem sempre haverá um jeitinho...”.

2018, ano de eleições, em que se esperava, depois de tantas revelações sobre a verdade de nossas empresas públicas, políticos, corrupção etc., alguma mudança substancial, dá sinais de que pouco mudará e que continuaremos sem plantar corretamente. Ainda não há união para repensar o Brasil, só umbigos a preservar. Enquanto nosso processo de evolução vai prosseguindo com graves sinais de agravamento da questão humana com reflexos diretos na produção.  Em alguma geração para frente, algo pior acontecerá. Até lá iremos vivendo neste empurra-empurra para a gestão seguinte, a qual, cada vez mais, estará atolada com seu funcionalismo arcaico de mentalidade sofrível e com seus nababos e marajás do médio e alto escalão dos Poderes, querendo mais e mais benefícios, numa espoliação irresponsável e inconsequente do erário sustentado pelo povo e empresas privadas. 

Odilon Reinhardt.  3.7.2018.