Mais
uma vez, o nada de novo.
3.7.2018.
Com o foco na bola, grande
porcentagem da mídia, ocupa-se com o rendimento do pão e do circo e deixa o
país viver um pouco sem a agitação televisiva, que cultiva e turbina a
ansiedade do dia a dia. Há uma pausa e a
população parece poder respirar sem as diárias e intensas chuveradas de
negativismo coletivo. As notícias espalha-brasa ou espanta-gato cessam por
alguns dias e há uma aparente calma na intenção de incluir o país inteiro em
realidades mais atrozes nos grandes centros. Pode-se pensar assim em condições
normais. Mas agora pensar assim seria uma “capitis de minutio” de qualquer
cidadão pensante. A realidade produz notícias ruins a toda hora, impossível
escondê-las.
Esvaziada a bola, encerrado
o circo, volta-se ao pleno cotidiano televisivo de agitação da audiência,
restando opção de desligar a TV ou não. Na verdade a realidade foi substituída,
desfocada, mas nada cessou. O tempo é só um, o dinheiro é que determina a
prioridade e intensidade das notícias. Tais fatos já não se repetem em 2018, pois
a bola não conseguiu o efeito de abstração. O noticiário continuou dividindo o
lance com a bola, mostrando os dias recheados de corrupção, violência, ações do
crime organizado, operações do tráfico, deficiências na infraestrutura e
serviços públicos etc. O efeito pão e circo parece não ter mais o efeito de
anestesiar a Pátria.
A realidade em que estamos,
com TV ou sem ela, continua a produzir consequências. As questões estruturais que foram
negligenciadas durante décadas pressionam a Nação e cutucam a realidade. Tomar
conta de tais questões é agora demorado, mormente quando não há dinheiro. A
maior questão estrutural, coluna vertebral do futuro é a Educação. Qual a
estratégia de nossa educação formal? No ano das eleições algum candidato
apresenta um plano de reformulação do sistema educacional? Tudo leva a pensar
que o programa de governo de cada candidato é ele mesmo. O programa é a
estratégia para ganhar as eleições. Depois é que verá o que fazer, de acordo
com a vontade e mando de seus financiadores.
Pressionado pelos vários
setores da sociedade, o Governo tem que resolver problemas acumulados e
urgentes no saneamento, na mobilidade, no meio ambiente, na economia etc. e a
Educação vai ficando de lado, sendo esquecida, pois, como imaterial produz
efeitos no indivíduo e é facilmente reduzida a problema individual e jamais
coletivo.
E assim , o “ Leviatã” criado está nos engolindo
lentamente. É o “ Gargantua e Pantacruel” que vão devorar a vida aqui. O sinal
vermelho está acesso há pelo menos duas décadas. Não é brincadeira. Os jovens
estão desqualificados para o mercado de trabalho mais avançado. As providências
estão sendo exigidas, mas como tomá-las? Há tempo? Pouco para semear e colher a
médio prazo. Muito para semear agora e colher em décadas. Que partido político
se interessa por isso?
Estamos doentes, atropelados
pelo que não foi feito, investido e criado. Agora a falta da colheita está
fazendo realidade cruel e a população vive na exigência, quer o que não foi
plantado. Os defeitos materiais são fruto da questão imaterial, a Educação.
Por falta de educação
formal, por falta de qualificação apropriada ao mundo atual mais avançado,
podemos estar perdendo a sintonia, ficando defasados em mão de obra
especializada e principalmente em mentes pensantes para ciência e tecnologia.
Podemos estar sendo condenados mesmo a ficar como fazenda do mundo e a
população obrigada a trabalhos manuais e braçais. Os jovens talvez tenham que ir se habituando
como horizonte mais curto, pouco dinheiro e um bom lugar para cortar frango e
entregar pizza.
A miséria do país é tanta
que nem os europeus vindos depois de 1870 conseguiram sair da vida sofrida do
campo, são vítimas da falta de escolas e infraestrutura, mal sabem falar o
Português, tendo preservado dialetos da língua que nem mais existem no país de
origem. São os capiaus, os colonos do
século 21, cultuando uma Itália, uma Alemanha, Polônia etc. que não existe
mais. O movimento MST é formado por quem?
Na mistura étnica e cultural
com a qual vamos formamos essa idiossincrasia nacional, somos o Brasil como ele
é hoje, resultante de políticas públicas desde 1500. Sem educação pública, deu
no que deu, um arremedo de “Frankstein” do mundo moderno em termos de
desenvolvimento humano e material. Somos feitos de retalhos, ora de fazenda de
grande valor, ora de tecido de baixa qualidade.
Por belas e novas avenidas
continuam passando a miséria e o sucesso, o desprovido de letras, o vazio de
tudo, a mediocridade e os arautos do progresso material mascarados de
excelência e autoridade. O celular está na mão de qualquer um na feira
experimental de eletrônicos que virou o país. Os bens materiais estão
acessíveis a qualquer um que tenha crédito. Mas a cabeça, como está a cabeça? O
que ali passa? O que carregam os cidadãos de todos os naipes? Como escrevem, o
que podem entender?
A insegurança de futuro, o
horizonte distante e miúdo, a preocupação com o umbigo, a desesperança quanto
ao progresso bem sedimentado, a visão miúda do aqui-agora fazendo o dia, a perda
da noção do certo e errado, o descrédito quanto ao porvir. Tudo tem um vir de
indagação, de dúvida e deixa o cidadão carregando sua cabeça pesada,
atormentada, pronta para explodir tal é insegurança quanto a realização dos
planos, desejos e projetos pessoais, todos condicionados e formatados pelos
sonhos ali enfiados pelos estímulos de modelos de nível econômico, tendente a
propiciar e satisfazer a vaidade , a aceitação
no social, o orgulho etc. O único ponto de segurança é que a pessoa continuará
a ser contrariada; viverá neste tom e deve estar pronta para se defender a
qualquer momento, pois aqui o Próximo virou rival e inimigo e competidor e
ladrão e assassino.
É o Brasil feito do
fisiológico, cada vez mais pele, emocional, carne. A falta de Educação nega o
desenvolvimento do intelecto, o esclarecimento e o progresso mental. Sem
Educação, a realidade é feita do bruto, do básico, do grotesco e os
relacionamentos são feitos do tosco encontro entre mundos selvagens.
A mão de obra vem carimbada
com este estigma. É sem qualidade, sem adereços mentais. Em qualquer ramo do
mercado, há desqualificação. Basta um aquecimento de algum setor e já se
observa a falta de mão de obra. Os reflexos econômicos são funestos e
limitadores. O país habituou-se a investir pouco, plantar pouco e quando
precisa, colhe o que plantou na safra da Educação.
Habituou-se a ser pequeno,
um país para poucos, de chances para poucos. Continuou a cultuar o “karma” de
cão vira-lata, a copiar moda e modelo do negativismo e seguir ideais piores dos
mundos do primeiro escalão. Se formos ficar neste padrão, teremos que nos
habituar a ele, aceitar seus limites e não se arvorar em querer alcançar
padrões de primeiro ou segundo mundo. É uma questão de viver a realidade,
assumir-se: o pobre convicto e feliz; o bom-selvagem. A estrutura de poder que
criou para o povo crenças dessa natureza deve estar feliz e sentindo-se
realizado em sua missão; conseguiu embotar um continente inteiro. Prevalece o
nivelamento por baixo, com máscara de humildade.
Passada a época da vida de
euforia e falsa luminosidade, como reagirão os jovens atuais e os das gerações
próximas quando descobrirem que muito do “ prometido pelo mercado” não lhes
será inacessível? Que pressão, tal lapso de consciência poderá exercer, para
quem desejar cumprir seus sonhos de consumo e constatar que não poderá fazer
nada? Hoje planta-se no sentido de “prometer “ padrões e modelos de aquisição
de bens que possam corresponder a um grau de “ felicidade” e inclusão ou
ascensão social sem garantir os meios. Como será a colheita? Como estarão os
índices de furtos e roubos? Que força terão as milícias e esquadrões do crime
organizado? É o culto do material como
expressão da aparência e de um sucesso sem mérito algum.
Sem estudo, sem Educação de
qualidade, tudo será mais difícil, mais inacessível e o ego estará sempre sendo
contrariado, oferecendo a ira social, a raiva do não ter, do não saber, o ciúme
e a inveja do não poder. O medíocre estará raivoso e revoltado, querendo
vingança pelo estado em que ficou. A revolta terá como origem a situação
pessoal, mas ficará mascarada na multidão e esta terá alguma bandeira descorada
de alguma revolução fantasiosa.
Certamente a incompreensão e
o inconformismo serão fortes nas exigências sociais. Ninguém desejará saber das
causas, mas exigirá remédios para as
consequências e governos da época estarão em situação difícil na busca
de contentamento da população. Como terá evoluído nosso autoritarismo,
intolerância, inflexibilidade quanto às diferenças de opinião, corrupção,
prepotência, violência física e mental? Como será a evolução de nosso modo
desonesto, brejeiro, corrupto de fazer negócios?
As consequências de uma
população, sem educação de qualidade, serão fatais para os negócios, os
empreendimentos, para as políticas públicas, serviço público e privado, pois a
base para a qualificação e progresso social não é feita de uma semana para
outra, mas pelo menos em duas décadas. Nem tudo no futuro será cortar frango e
cuidar do gado. Será cada vez mais exigido esclarecimento, discernimento,
capacidade de entendimento e diálogo, bom senso, vontade de crescer.
Nossos avanços materiais
esquecem o ser humano. Está visível que a quaisquer quilômetros da rua
principal das grandes cidades encontramos realidades do Brasil de 1920 a 1950.
A infraestrutura vai se esvaindo no distanciamento das cidades, mas mesmo assim
é melhor do que nas décadas mencionadas, todavia o que chama a atenção é a
condição humana, o pensamento, o grau de esclarecimento e qualificação da mão
de obra. A Educação foi esquecida, abandonada. Máquinas mais refinadas poderão
ficar paradas por falta de operadores ou técnicos de manutenção com maior
frequência. Uma realidade a ser amplificada, pois hoje já há máquinas que ficam
paradas esperando o técnico de manutenção que vem da Europa ou outro país. Há
máquinas sofisticadas, doadas ou adquiridas, que nem chegam a sair da caixa por
falta de mão de obra.
Em 2018, há uma esperada
eleição que seria esquina do tempo, mas nada. Os políticos não esboçam nenhum
sinal de mudança; estão acomodados, jogando o mesmo jogo, as mesmas regras, o
mesmo baralho velho e marcado. Não há planos novos que possam ser tomados com
atenção; só palavras de faz de conta. A nossa evolução como sociedade tem sua
manha, seu jeito. Estamos atrasados por que ficamos atrasados e é este o nosso
passo, é esta nossa picada ainda para sair do mato da nossa cultura, sovada e
assada desde 1500. O nosso aprendizado coletivo segue lento, com anos de avanço
e anos de reprovação e assim prosseguimos em nossa História. Nosso
subdesenvolvimento tem raízes coloniais e estigmas do rural e do selvagem e
levará décadas e décadas para chegar à civilização plena.
Mudanças de gestão poderão
ocorrer, mas não de atitudes e de pensamento. Ainda levará décadas até a
colheita, se hoje pudermos plantar algo de bom. E plantar é só na Educação.
Poderemos continuar com obras para fazer propina, talvez agora com maior
sofisticação em seu pagamento, mas elas só serão o material e nunca o
espiritual para a mudança. A carroça de legumes que passa pela picada até a
cidade pode passar por uma bela avenida, mas continuará uma carroça, um veículo
de passeio ou será um caminhão de legumes, mas seu motorista continuará a ser o
mesmo, com o mesmo comportamento tosco, autoritário, intolerante, inflexível,
egoístico, violento, pronto para qualquer devaneio.
A vida continuará a produzir
seres moralmente desqualificados para os setores da vida produtiva; a produzir
cidadãos grotescos na aparência e no comportamento; a propiciar os negócios
feitos com corrupção, desonestidade, eivados de má–fé, antiéticos,
irresponsáveis e descomprometidos com o país, mas perfeitamente adequados ao
umbigo de cada um.
E tal cenário social,
certamente viverá momentos ainda mais intensos de contrariedade, violência,
ações e reações egoísticas, fazendo com que o relacionamento pessoal seja mais
violento e animalesco. E o rebanho está ficando velho, calejado, sem esperanças
e sem nada para perder. Pessoas para as quais a verdade já silenciou na boca
por falta de palavras, mas que pode embalar a mão de seus descendentes, já
espoletas de revolta. Cresce o
desrespeito aos padrões de vida digna e inteligente. Aumenta o desrespeito às
instituições e autoridades, aumenta a atuação dos meios de polícia. Há sinal
pior de semente de má qualidade? Uma
sociedade onde a educação não é a prioridade para todos é regida pelo
fisiológico, pela emoção, pela carne e isto não é um modo de vida de bons
resultados. A estratégia melhor seria priorizar a educação como meio justo de
“subir na vida”. Na falta ou negligência quanto a dar estímulos para que os
jovens decidam adotar os estudos como meio de progresso pessoal, o que se pode
esperar é descaso, depois revolta.
Hoje já se pode ver que
qualquer um, a qualquer tempo e por qualquer razão, não descartado o devaneio,
a loucura pessoal, pode pelo celular arregimentar seguidores para iniciar um
ataque ao Próximo ou a uma instituição. Basta que o convite encontre respaldo
na ira popular, estocada em razão de inúmeros problemas pessoais e coletivos e
inicia-se uma crise sem precedentes. Com a
ansiedade provocada pela época atual, todos querem resultados rápidos, o
que é impossível em muitos casos, principalmente na Educação.
Basta um “hoje tem
quebra-quebra na rua tal...” e lá vai cada um fazer a multidão explodir,
procurando mudar algo, por meios que não incluem a possibilidade de diálogo,
mas, sim, vontade de desabafar sem nada resolver.
Só a Educação de qualidade,
com objetivos de formar seres livres e conhecedores da universalidade de
conhecimentos, pode ajudar cada pessoa a pensar melhor, a ter metas superiores
de vida, a desejar alcançar inteligência que possa ajudar a melhorar a vida e a
convivência. Sem Educação, só se conhece
a mediocridade da manada e seus condicionamentos baixos e fisiológicos do
animal, querendo sobreviver e entregando-se à manipulação, à falsa condução.
Sem Educação não há valorização de ideais inteligentes nem de valores da Nação.
Na última ocasião de
demonstração de descompromisso com a democracia e seus meios de debate, a
desobediência civil, o desrespeito ao cidadão e sua família, vimos os sinais perigosos
da mentalidade incendiária; cada um se sentiu mais perto do que deve ser países
onde a gestão do Governo com erros estratégicos que levam ao desabastecimento,
pobreza, agravamento de tudo. A má gestão da coisa pública pode, sim, levar ao
caos, invasões, saques, crimes etc. E mais, levar o cidadão a ver no Próximo um
rival e um competidor. É imperdoável a negligência, pois o tempo cobrará em
vidas e no material o descaso com a Educação. Nenhum país consegue sobreviver
dignamente sem ela. No mundo atual, um país pode aguentar por algumas décadas ,
mas logo ficará clara sua posição escravizada.
Difícil não recorrer a David
Nasser que em 1963 escreveu, incrível “a indiferença do brasileiro do centro,
do brasileiro acomodado, contemplativo, preso a um Brasil brasileiro, que não
mais existe, certo de que Deus ainda é brasileiro, convencido de quem sempre
haverá um jeitinho...”.
2018, ano de eleições, em
que se esperava, depois de tantas revelações sobre a verdade de nossas empresas
públicas, políticos, corrupção etc., alguma mudança substancial, dá sinais de
que pouco mudará e que continuaremos sem plantar corretamente. Ainda não há
união para repensar o Brasil, só umbigos a preservar. Enquanto nosso processo
de evolução vai prosseguindo com graves sinais de agravamento da questão humana
com reflexos diretos na produção. Em
alguma geração para frente, algo pior acontecerá. Até lá iremos vivendo neste
empurra-empurra para a gestão seguinte, a qual, cada vez mais, estará atolada
com seu funcionalismo arcaico de mentalidade sofrível e com seus nababos e
marajás do médio e alto escalão dos Poderes, querendo mais e mais benefícios,
numa espoliação irresponsável e inconsequente do erário sustentado pelo povo e
empresas privadas.
Odilon Reinhardt. 3.7.2018.