Tempo das consequências.
Não
basta trabalhar, há que haver futuro bom.
Esperança e fé nos governantes nunca deixou de existir. Eleitos e seus
assessores que são indicados e não eleitos, devem colocar o país em rumo
diferente. Todavia, a falta de Educação de qualidade nunca foi tão evidente,
tendo-se tornado a raiz de problemas estruturais. O abuso foi enorme, o desleixo
monstruoso, a negligência terrorista. É o tempo de colher. Os efeitos aparecem
no dia a dia, na qualidade das soluções, na prestação do serviço, no exercício
de ofícios e profissões, no escritório, no consultório, na oficina, no
restaurante, no relacionamento pessoal, nos negócios. Uma tragédia danosa e
perturbante.
O mercado dobra-se ao analfabetismo para não perder o contato com o
consumidor. A língua portuguesa é deteriorada para chegar ao povo; falar,
destruindo as regras gramaticais, dá a sensação de as pessoas serem informais,
mais democráticas, serem atuais e jovens. Via mídia, o marketing garante a
aproximação com a “galera”, mantendo a soberania dos níveis inferiores da baixa
alfabetização. O país dobra-se ao
fisiológico e vive do nível de mediocridade em vários setores artísticos, que
detona as letras de músicas, os diálogos teatrais, etc. O que interessa é
vender o popular, sem forçá-lo a se inspirar em algo mais elevado como se a
miséria fosse algo perpétuo e as pessoas nela estivessem acorrentadas na
existência. Que ideologia alimenta tal disparate?Rejeita-se qualquer modelo,
qualquer padrão mais intelectual porque sua adoção passou a ser vista como algo
elitista, conservador, autoritário e distanciado do povo.
Não se exige nada, respeito a qualquer nível que exija esforço
intelectual para que a pessoa sinta-se inspirada ou mesmo forçada a alavancar
seus conhecimentos e sinta que deve seguir etapas para crescer. A mediocridade
e o nivelamento por baixo parecem reinar. Há o esvaziamento dos bons modelos
sob a justificativa de terem sido criados pela “elite”.
O país vive na oralidade, com poucos livros novos e de qualidade, poucos
jornais, pouco interesse na leitura. Vale a imagem, a foto, os números e o que
a TV deles diga. A crítica, o pensamento, a interpretação e o discernimento são
terceirizados para o comentarista, para o âncora de TV. É a progressiva
tendência no caminho de esvaziamento intelectual. Na enxurrada vão as
pessoas para a vala comum a poesia, o
romance, o amor bem como qualquer outra manifestação humana mais sensível,
porque o pragmatismo e o utilitarismo dominaram o cenário, levando a esta
situação de morte do cérebro pensante e para esta falência do pensamento e a
progressiva redução da sensibilidade. A
cada dia uma evolução social baseada em filosofias boas para a fábrica e sua
linha de produção, filosofias que orientam a massa também mas relações sociais
e familiares, produzindo um país rude, grosso, insensível, egoísta, violento e sem Educação.
O país torna-se cada vez mais um rebanho de seguidores, que em hordas
fisiológicas, vivem e se alimentam de dias pobres e sem qualquer encanto ou
elevação intelectual. Os livres pensadores fazem raridade e mesmo entre eles o
egoísmo os joga em seus desertos. A intelectualidade deixa de ser profusa,
variada, passando a concentrar-se em ideologias decaídas, em assuntos
ultrapassados, os quais que no país parecem um círculo vicioso; certos
temas são trazidos à discussão de modo que parecemos estar em 1910 ou até no
século XVI; fatos históricos são discutidos e criticados com os olhos e valores
de hoje, por falta de estudo e conhecimento.
O fato é que a Educação da década de 1970 para cá vem sendo
descurada em suas bases. Os resultados
aparecem no Enem e outros testes nacionais. Inegável a existência de péssimos
resultados e nos castelos do Poder o assunto não é prioridade, não rende votos,
não é nada. Há uma cegueira que impede de observar que os resultados são
pragmáticos também, aparecem na dificuldade de achar soluções no dia a dia nos
mais variados setores produtivos, onde visivelmente a carência de mão de obra
assusta qualquer empreendedor, simplesmente por falta de pensadores,
idealizadores. Todo dia, recorre-se aos consultores, doutores ou especialistas,
os quais tentam suas fórmulas,
geralmente alienígenas, feitas em famosas faculdades, mas pouco testadas .
Aliás, o país é um excelente campo de testes em vários setores e também no
educacional. Teorias, teses etc., que não deram em nada. 96¨% da população é de
semianalfabetos. Não há unanimidade em
nada, só uma interminável luta de egos e inconsequente disputa ideológica
atrasada, enquanto milhares de crianças, adolescentes e acadêmicos são vitimas
desse estelionato que os marcará para sempre.
Hoje os estudantes não aprendem a seguir o valor do estudar, ler,
debater, escrever, ganhar conhecimento geral, esclarecer a vida, criticar, ter
curiosidade saber, descobrir talentos, procurar oportunidades intelectuais de
crescimento individual e coletivo. Se isto ocorre, é logo desestimulado face ao
fascínio pelo mundo real do consumo, que cada vez mais apresentam mais e mais
fontes de distração, de passageiras modinhas. Como superar tais atrações,
impondo atividades escolares tidas como monótonas e sem contribuição alguma
para a aparência, competição e comparações? Enganados os jovens perdem precioso
tempo de preparação, pensando poder recuperar quando desejarem, enquanto a vida
segue e provavelmente ensinará a cada um que “uma criança só tem 7 anos uma
vez”.
E assim vai o país mantendo seu imaginário coletivo irreal e nebuloso,
inconsequente e irresponsável.
Considerando os últimos 519 anos, podemos estar na pior época, a das
consequências. O esboço de humanidade aqui tentada desencontra-se com o paraíso
geográfico. Inquilinos da terra bonita e formosa, parecem estar seguindo rotas
em desertos verdes sem saber onde chegar.
De geração em geração, pouco é feito, muito é destruído em termos de
construção intelectual humanística. É o processo iniciado com a Reforma de
Ensino do Ministro Passarinho, que a título de democratizar o ensino, reduziu o
“curriculum” escolar para Matemática, Português, Geografia e História,
abandonando assim o modelo francês de ensino enciclopédico e que visava a
construção do cidadão em termos humanos e como elemento da civilização. Mesmo
diante de tal drástica redução, nada deu certo. Não houve avanço nem para os
jovens destinados a plantar, colher, cuidar do gado, cortar frango etc. O
objetivo democrático no ensino falhou pela qualidade, produziu evasão, reprovação,
excluiu. Que tipo de mão de obra temos hoje?
Já que gostam tanto de pragmatismo e utilitarismo, que se questionem
para que servem, que qualidade têm? As incógnitas nos levam a questionar: há
tempo para recuperação?
Dos castelos do Poder, o Leviatã está engolindo a todos com a imposição
de rotinas de sempre, futricas de corredor, assuntos menores espalhados pelas
redes sociais e imprensa, lutas mesquinhas norteadas por vaidades, invejas,
ciúmes e muito orgulho. Evidenciam-se assuntos que a nada levam e a Educação de
1972 até agora tem sido brinquedo na mão de caprichosos burocratas e
acadêmicos. Como elevar o cidadão, como dar-lhe estímulo e dignidade, como
incluir modelos mais nobres a serem seguidos para o bem do saber e do país?
Apesar do elogiável esforço de milhares de professores da rede pública e
privada, o fato é que muitos são meros operadores e representantes da mesma
sociedade defeituosa, fisiológica e egoica. O sistema utilizado falha no
conteúdo e na sua exposição, na falta de materiais atualizados, na precariedade
das instalações, na falta de pensar grande e no país do futuro. O Enem tem sido
a prova cabal desse fracasso. O dia a dia do país tem sido o campo de prova de
resultados do sistema em frangalhos.
O sistema é insuficiente para dar ao jovem modelos superiores a serem
seguidos. E então pergunta-se, neste país de terceiro mundo, a que modelos
estão expostas as novas gerações e que tem desaguado neste desinteresse pelos estudos e nesta
grande inconsciência, despreparo e deserto intelectual? Cabeça vazia é a
oficina do diabo. Alguém tem argumentos para dizer que não?.
96% de semianalfabetos estão por aí, sem palavras suficientes para se
expressar, para pensar, acumulando raiva social, insatisfação, contrariedades
que só podem ser exprimidas pelos modos mais brutos e selvagens. A violência
explícita e implícita usada como
desabafo só tende a crescer.
Que sistemas estão ocupando o vazio deixado pela ineficácia da Educação?
Que “professores” estão sendo mais eficazes junto aos jovens e adultos? Que
sistemas estão tendo sucesso em atiçar cada vez mais o ego, o fisiologismo e a
consequente selvageria frente a cada contrariedade do ego humano redundando em
violência sem precedentes?
Temos construído as bases frágeis para uma construção doentia. Adultos
despreparados, frios, calculistas, insensíveis, alienados, arrogantes, e
sempre prontos para a reação física
violenta, resultante da falta de Educação ampla, de qualidade e humana. São as
pessoas que vão ocupar os cargos públicos, as posições nas empresas privadas,
os gerentes e os presidentes sem compromisso com nada a não ser seus interesses
de umbigo. Que futuro se faz com tal mão de obra? E não há consequências?
É o país do Deus-dará, dará as costas, dará pena, dará em nada
aproveitável. E queremos ter posição no mundo, participar de decisões, exportar
itens de interesse mundial para aumentar nossas receitas? Com que não de
obra?
Espera-se que a Educação de qualidade seja encarada doravante como
prioridade para que o país progrida com sustentabilidade humana. Se cada
ministro do STF, por onde transita, é o próprio STF, por que um dia o professor
não pode ser o próprio Ministério da Educação?
Por enquanto mais triste do que a realidade é o inferno de ficar olhando
tudo isto sem nada poder fazer e de só ter um voto.
Sem Educação de qualidade, gerações permanecerão escravas da pobreza
mental por muitas décadas; nunca cessará o esperar que o país seja salvo por
algo divino, por alguém que tenha a solução central, que melhore de cima para
baixo sem que o cidadão tenha que participar ou se esforçar; a coletividade
nunca chegará a pensar que o país se faz
pela soma dos interesses pessoais orientados para o progresso, seguindo modelos
dignos de desenvolvimento.
Nação e país permanecerão expostos ao acaso, à decisão de alguns e as
soluções menores de assuntos pouco prioritários para o futuro. A violência
continuará a se exprimir, tanto a explícita com fatos horrendos quanto a que
fica reprimida, a que devora a saúde e a qualidade de vida do cidadão. Será
ilusão pensar que não conheceremos a selvageria antes da civilização, porque
isto já está ocorrendo. Poderá o estado providenciar a contento serviços e
instrumental para conter tal tendência?
A falta de investimento sério e coerente em Educação de qualidade, a
falta de revisão dos métodos e
conteúdos, que claramente não têm atingido o aluno, tem contribuído para a realidade atual onde
os jovens e as pessoas estão expostas a outros tipos de “ professores”, os
quais são atuais, eficazes em seus objetivos.
Se o Governo é materialista, gosta de recursos, que tente fazer uma
empresa e veja como está a qualidade da mão de obra; que observe quanto tempo
durará até que feche as portas por este mesmo motivo. Empresas fecham as portas, mas a causa apresentada
é a concorrência, mudança de mercado, perda de lucratividade enquanto ninguém
ousa admitir que o fechamento foi causado por problemas de mão de obra em todos
os cargos, falta de ideais, falta de administração, problemas corporativos
criados pelos próprios empregados por
falta de gestão etc. Sem providências sérias e coerentes, até quando
aguentaremos? As consequências estão
ferozes , graves e expondo a vida à instabilidade e insegurança
permanentes.
Odilon Reinhardt. 3.4.2019.