quarta-feira, 3 de abril de 2019

Tempo de consequências








                                                       Tempo das consequências.

                                             Não basta trabalhar, há que haver futuro bom.







Esperança e fé nos governantes nunca deixou de existir. Eleitos e seus assessores que são indicados e não eleitos, devem colocar o país em rumo diferente. Todavia, a falta de Educação de qualidade nunca foi tão evidente, tendo-se tornado a raiz de problemas estruturais. O abuso foi enorme, o desleixo monstruoso, a negligência terrorista. É o tempo de colher. Os efeitos aparecem no dia a dia, na qualidade das soluções, na prestação do serviço, no exercício de ofícios e profissões, no escritório, no consultório, na oficina, no restaurante, no relacionamento pessoal, nos negócios. Uma tragédia danosa e perturbante.

O mercado dobra-se ao analfabetismo para não perder o contato com o consumidor. A língua portuguesa é deteriorada para chegar ao povo; falar, destruindo as regras gramaticais, dá a sensação de as pessoas serem informais, mais democráticas, serem atuais e jovens. Via mídia, o marketing garante a aproximação com a “galera”, mantendo a soberania dos níveis inferiores da baixa alfabetização.   O país dobra-se ao fisiológico e vive do nível de mediocridade em vários setores artísticos, que detona as letras de músicas, os diálogos teatrais, etc. O que interessa é vender o popular, sem forçá-lo a se inspirar em algo mais elevado como se a miséria fosse algo perpétuo e as pessoas nela estivessem acorrentadas na existência. Que ideologia alimenta tal disparate?Rejeita-se qualquer modelo, qualquer padrão mais intelectual porque sua adoção passou a ser vista como algo elitista, conservador, autoritário e distanciado do povo.

Não se exige nada, respeito a qualquer nível que exija esforço intelectual para que a pessoa sinta-se inspirada ou mesmo forçada a alavancar seus conhecimentos e sinta que deve seguir etapas para crescer. A mediocridade e o nivelamento por baixo parecem reinar. Há o esvaziamento dos bons modelos sob a justificativa de terem sido criados pela “elite”.

O país vive na oralidade, com poucos livros novos e de qualidade, poucos jornais, pouco interesse na leitura. Vale a imagem, a foto, os números e o que a TV deles diga. A crítica, o pensamento, a interpretação e o discernimento são terceirizados para o comentarista, para o âncora de TV. É a progressiva tendência no caminho de esvaziamento intelectual. Na enxurrada vão as pessoas  para a vala comum a poesia, o romance, o amor bem como qualquer outra manifestação humana mais sensível, porque o pragmatismo e o utilitarismo dominaram o cenário, levando a esta situação de morte do cérebro pensante e para esta falência do pensamento e a progressiva redução da sensibilidade.  A cada dia uma evolução social baseada em filosofias boas para a fábrica e sua linha de produção, filosofias que orientam a massa também mas relações sociais e familiares, produzindo um país rude, grosso, insensível, egoísta,  violento e sem Educação. 

O país torna-se cada vez mais um rebanho de seguidores, que em hordas fisiológicas, vivem e se alimentam de dias pobres e sem qualquer encanto ou elevação intelectual. Os livres pensadores fazem raridade e mesmo entre eles o egoísmo os joga em seus desertos. A intelectualidade deixa de ser profusa, variada, passando a concentrar-se em ideologias decaídas, em assuntos ultrapassados, os quais  que  no país parecem um círculo vicioso; certos temas são trazidos à discussão de modo que parecemos estar em 1910 ou até no século XVI; fatos históricos são discutidos e criticados com os olhos e valores de hoje, por falta de estudo e conhecimento. 

O fato é que a Educação da década de 1970 para cá vem sendo descurada  em suas bases. Os resultados aparecem no Enem e outros testes nacionais. Inegável a existência de péssimos resultados e nos castelos do Poder o assunto não é prioridade, não rende votos, não é nada. Há uma cegueira que impede de observar que os resultados são pragmáticos também, aparecem na dificuldade de achar soluções no dia a dia nos mais variados setores produtivos, onde visivelmente a carência de mão de obra assusta qualquer empreendedor, simplesmente por falta de pensadores, idealizadores. Todo dia, recorre-se aos consultores, doutores ou especialistas, os quais tentam  suas fórmulas, geralmente alienígenas, feitas em famosas faculdades, mas pouco testadas . Aliás, o país é um excelente campo de testes em vários setores e também no educacional. Teorias, teses etc., que não deram em nada. 96¨% da população é de semianalfabetos.  Não há unanimidade em nada, só uma interminável luta de egos e inconsequente disputa ideológica atrasada, enquanto milhares de crianças, adolescentes e acadêmicos são vitimas desse estelionato que os marcará para sempre. 

Hoje os estudantes não aprendem a seguir o valor do estudar, ler, debater, escrever, ganhar conhecimento geral, esclarecer a vida, criticar, ter curiosidade saber, descobrir talentos, procurar oportunidades intelectuais de crescimento individual e coletivo. Se isto ocorre, é logo desestimulado face ao fascínio pelo mundo real do consumo, que cada vez mais apresentam mais e mais fontes de distração, de passageiras modinhas. Como superar tais atrações, impondo atividades escolares tidas como monótonas e sem contribuição alguma para a aparência, competição e comparações? Enganados os jovens perdem precioso tempo de preparação, pensando poder recuperar quando desejarem, enquanto a vida segue e provavelmente ensinará a cada um que “uma criança só tem 7 anos uma vez”.

E assim vai o país mantendo seu imaginário coletivo irreal e nebuloso, inconsequente e irresponsável.

Considerando os últimos 519 anos, podemos estar na pior época, a das consequências. O esboço de humanidade aqui tentada desencontra-se com o paraíso geográfico. Inquilinos da terra bonita e formosa, parecem estar seguindo rotas em desertos verdes sem saber onde chegar.  De geração em geração, pouco é feito, muito é destruído em termos de construção intelectual humanística. É o processo iniciado com a Reforma de Ensino do Ministro Passarinho, que a título de democratizar o ensino, reduziu o “curriculum” escolar para Matemática, Português, Geografia e História, abandonando assim o modelo francês de ensino enciclopédico e que visava a construção do cidadão em termos humanos e como elemento da civilização. Mesmo diante de tal drástica redução, nada deu certo. Não houve avanço nem para os jovens destinados a plantar, colher, cuidar do gado, cortar frango etc. O objetivo democrático no ensino falhou pela qualidade, produziu evasão, reprovação, excluiu. Que tipo de mão de obra temos hoje?  Já que gostam tanto de pragmatismo e utilitarismo, que se questionem para que servem, que qualidade têm? As incógnitas nos levam a questionar: há tempo para recuperação?

Dos castelos do Poder, o Leviatã está engolindo a todos com a imposição de rotinas de sempre, futricas de corredor, assuntos menores espalhados pelas redes sociais e imprensa, lutas mesquinhas norteadas por vaidades, invejas, ciúmes e muito orgulho. Evidenciam-se assuntos que a nada levam e a Educação de 1972 até agora tem sido brinquedo na mão de caprichosos burocratas e acadêmicos. Como elevar o cidadão, como dar-lhe estímulo e dignidade, como incluir modelos mais nobres a serem seguidos para  o bem do saber e do país?

Apesar do elogiável esforço de milhares de professores da rede pública e privada, o fato é que muitos são meros operadores e representantes da mesma sociedade defeituosa, fisiológica e egoica. O sistema utilizado falha no conteúdo e na sua exposição, na falta de materiais atualizados, na precariedade das instalações, na falta de pensar grande e no país do futuro. O Enem tem sido a prova cabal desse fracasso. O dia a dia do país tem sido o campo de prova de resultados do sistema em frangalhos.

O sistema é insuficiente para dar ao jovem modelos superiores a serem seguidos. E então pergunta-se, neste país de terceiro mundo, a que modelos estão expostas as novas gerações e que tem desaguado  neste desinteresse pelos estudos e nesta grande inconsciência, despreparo e deserto intelectual? Cabeça vazia é a oficina do diabo. Alguém tem argumentos para dizer que não?.

96% de semianalfabetos estão por aí, sem palavras suficientes para se expressar, para pensar, acumulando raiva social, insatisfação, contrariedades que só podem ser exprimidas pelos modos mais brutos e selvagens. A violência explícita e implícita usada  como desabafo só tende a crescer.

Que sistemas estão ocupando o vazio deixado pela ineficácia da Educação? Que “professores” estão sendo mais eficazes junto aos jovens e adultos? Que sistemas estão tendo sucesso em atiçar cada vez mais o ego, o fisiologismo e a consequente selvageria frente a cada contrariedade do ego humano redundando em violência sem precedentes?

Temos construído as bases frágeis para uma construção doentia. Adultos despreparados, frios, calculistas, insensíveis, alienados, arrogantes, e sempre  prontos para a reação física violenta, resultante da falta de Educação ampla, de qualidade e humana. São as pessoas que vão ocupar os cargos públicos, as posições nas empresas privadas, os gerentes e os presidentes sem compromisso com nada a não ser seus interesses de umbigo. Que futuro se faz com tal mão de obra? E não há consequências?

É o país do Deus-dará, dará as costas, dará pena, dará em nada aproveitável. E queremos ter posição no mundo, participar de decisões, exportar itens de interesse mundial para aumentar nossas receitas? Com que não de obra? 

Espera-se que a Educação de qualidade seja encarada doravante como prioridade para que o país progrida com sustentabilidade humana. Se cada ministro do STF, por onde transita, é o próprio STF, por que um dia o professor não pode ser o próprio Ministério da Educação?

Por enquanto mais triste do que a realidade é o inferno de ficar olhando tudo isto sem nada poder fazer e de só ter um voto.

Sem Educação de qualidade, gerações permanecerão escravas da pobreza mental por muitas décadas; nunca cessará o esperar que o país seja salvo por algo divino, por alguém que tenha a solução central, que melhore de cima para baixo sem que o cidadão tenha que participar ou se esforçar; a coletividade nunca  chegará a pensar que o país se faz pela soma dos interesses pessoais orientados para o progresso, seguindo modelos dignos de desenvolvimento.

Nação e país permanecerão expostos ao acaso, à decisão de alguns e as soluções menores de assuntos pouco prioritários para o futuro. A violência continuará a se exprimir, tanto a explícita com fatos horrendos quanto a que fica reprimida, a que devora a saúde e a qualidade de vida do cidadão. Será ilusão pensar que não conheceremos a selvageria antes da civilização, porque isto já está ocorrendo. Poderá o estado providenciar a contento serviços e instrumental para conter tal tendência?

A falta de investimento sério e coerente em Educação de qualidade, a falta de  revisão dos métodos e conteúdos, que claramente não têm atingido o aluno,   tem contribuído para a realidade atual onde os jovens e as pessoas estão expostas a outros tipos de “ professores”, os quais são atuais, eficazes em seus objetivos.

Se o Governo é materialista, gosta de recursos, que tente fazer uma empresa e veja como está a qualidade da mão de obra; que observe quanto tempo durará até que feche as portas por este mesmo motivo.  Empresas fecham as portas, mas a causa apresentada é a concorrência, mudança de mercado, perda de lucratividade enquanto ninguém ousa admitir que o fechamento foi causado por problemas de mão de obra em todos os cargos, falta de ideais, falta de administração, problemas corporativos criados pelos próprios  empregados por falta de gestão etc. Sem providências sérias e coerentes, até quando aguentaremos?   As consequências estão ferozes , graves e expondo a vida à instabilidade e insegurança permanentes.   



Odilon Reinhardt.  3.4.2019.