Mais
um centro esquecido III?
Banalizado quanto ao seu papel para a produção de qualidade, esquecido
quanto ao seu status na qualidade da vida, o local de trabalho de milhões de
pessoas vem, no entanto, sofrendo as
eventuais melhorias que os delegados de cada empreendedor decidem implantar,obedecendo
sempre a racionalidade e o pragmatismo imposto do custo benefício.
Não há uniformidade quanto ao que fazer para reduzir a agrura da
realidade dos resultados frente à redução da produtividade ou do seu aumento
mediante altos custos para a empresa e para todos que ali convivem, com
reflexos para o país. As soluções são
individuais, submetidas a regras trabalhistas existentes, quase todas de
natureza protecionista-paternalista, basicamente impregnadas do fundamento de
que o empregado é uma nulidade e o empregador um explorador e sempre limitadas
aos limites da lucratividade num ambiente de total insegurança e instabilidade,
onde os Governos têm tido sua
participação sempre desastrada.
O empreendedor, aquele que arriscou, endividou-se para criar empregos,
para gerar renda e impostos, é visto como um explorador capitalista. Que
ideologia leva a isto e fez a realidade retrógrada por tantas gerações? Que
ideologia contribuiu para que o país permanecesse pequeno no seu pensar?
O assunto é de interesse social, mas as iniciativas de melhoria e
progresso serão sempre particulares na medida que o tema é visto como fator
diferencial entre as empresas, cada uma com seus segredos na disputa pelo sucesso no mercado. As práticas
internas, com seus sucessos e insucessos, são assunto interno. Boas práticas no
setor só são divulgadas até o limite que não revelem detalhes do segredo de
cada empresa.
Considerando a enorme quantidade de empreendimentos privados e sua diversidade de organização e composição,
uma crise econômica atiça a competição, mas não altera a visão errônea de que o
local de trabalho em seus aspectos físicos e humanos é menos importante para os
resultados da empresa, tanto assim é, que ,diante de qualquer financeira crise,
o setor de treinamento é o primeiro a ser vitimado com cortes bruscos, bem como
qualquer benefício para o humano.
E na crise permanente do país,
com o desemprego e seus efeitos, quem tem o privilégio de manter o emprego ou
de conseguir um local de trabalho aceita qualquer condição, sujeita-se a tudo
pelo salário salvador; aceita o local, suas mazelas e sua cultura, feita por
pessoas que ali habitam e por tradicionais erros de organização, planejamento e
um sistema de recursos humanos voltado ao cumprimento de rotinas trabalhistas e
não verdadeiramente voltado aos humanos e sua inteligência.
Nem se ouse falar em correta motivação e sua sustentabilidade para
tornar a empresa um centro de aprimoramento do ser humano. Evidentemente, não se pode deixar de pensar nos erros e intenções em prol da uniformidade e
padronização, abarcando a todos como se iguais fossem, menosprezando suas
diferenças. O que se pode objetivar no campo do ideal é que tantos erros
contribuam para o surgimento de idéias que criem condições melhores a fim de
possibilitar no local de trabalho, ou melhor dizendo, no "local de
vida", a implantação progressiva de estímulos ao pensamento de
prosperidade e libertação das ideologias erradas que até agora têm sido a
estrutura da vida de miséria intelectual.
Gerentes e diretores administrativos, de variada educação e gama, tendem
, de acordo com seu estilo gerencial, implantar sistemas e rotinas de pessoal,
visando o treinamento, folha de pagamento, recrutamento e seleção etc., mas
raramente têm sucesso no sistema de motivação e inteligência emocional. Isto
ocorre, porque num ambiente altamente estressado, pragmático e racional, os
aspectos humanos acabam sendo relevados e deixados em segundo plano, quer por
desamor ao Próximo apesar de 519 anos de pregação católica, quer pela
desorganização administrativa, a qual vive no sistema de gerenciamento de crise
e eliminação e fogueiras, quer pelo conjunto da empresa e seus ocupantes que
nunca deixam de espelhar os defeitos da própria sociedade a que pertencem.
Não é incomum que o despreparo gerencial
adote técnicas erradas e estas venham a descambar para o estágio em que
o recurso usado é manter o pessoal ameaçado, com mensagens de fusão
empresarial, venda da empresa ( no setor público, a privatização), tudo para que
as pessoas não reclamem, fiquem sempre acuadas e trabalhem mais, não tenham
pretensões salariais maiores nos momentos de acordo coletivo etc., aceitem a
administração como ela se apresenta, pois, tudo torna-se um esforço para salvar
a empresa, o salário. É o ponto maquiavélico mais agressivo. O objetivo é
manter a realidade sempre em perigo, em instabilidade. Outra estratégia comum é pregar que lá fora
no mercado tudo é muito pior. O pior é que do próprio pessoal, são escolhidos pela gerência os formadores de
opinião que devem plantar tais mensagens na rádio peão. Notícia ruim espalha-se
com rapidez e quase nunca é negada.
A maioria das empresas vive assim, ilhas de amargura, mas a produção
continua sendo feita e vendida pelo que as nuances humanas são engolidas com
farofa seca e relegadas ao drama do universo pessoal de cada pessoa. Mas quase
sempre a evolução do problema recorrente leva a um ponto de estrangulamento e a
organização adoece e exige,portanto, tratamento.
O empreendedor, diante dos números acusando queda de qualidade e das
vendas, pergunta a si mesmo qual foi o erro.
É esta a mão de obra que o Governo prepara com seu danado sistema de
Educação? São estes os cidadãos e o que fazem quando reunidos? Diante da margem
de lucro comprometida, o que fazer para mudar a realidade? Este recurso é o
fator negativo imutável que deve ser considerado como constante no risco do negócio e do custo
que o país apresenta?
No miudinho, foi falha do setor de admissão? Falhou a seleção?
Geralmente, os problemas de pessoal e seu desenvolvimento são tidos como
resposta às questões acima. Como nenhum
administrador é psicólogo ou psicanalista para fazer tratamento de pessoal,
porque o caso é de grupo ou de massa, até uma análise organizacional raramente,
apesar de propor, consegue resolver o problema instalado. O que se consegue é
uma reengenharia de unidade, mas quase nunca melhorias para o
"pessoal", um problema que se gera e se basta.
E com o passar do tempo, mesmo que algo novo tenha sido instalado, tudo volta à estaca zero e nova análise é
necessária, a preço de ouro, porque a produção está sendo afetada e o
desempenho da empresa comprometida, mas a culpa é colocada no sistema
utilizado, defasado, e nunca no pessoal, com se o material, as máquinas,etc., tivessem
vida e a propriedade de gerar o mundo por si só. Esta visão puramente material
cega a todos e impede soluções de fundo.
Diante da impossibilidade de resolver, em definitivo, o problema humano
no local de trabalho, as empresas que possuem recursos, de tempos em tempos,
continuam a sobreviver com ajustes, mas pecam nos fundamentos. As demais
empresas vão sendo estranguladas até perder o mercado e fechar as portas,
geralmente na falência. Perde o Brasil, perde o consumo-receita, perde o
empresário, e muitos perdem o emprego. A questão é material?
Na cadência de aberturas e fechamentos de empresas, quanta energia é
gasta? Quanto perde o país, quanto sofre a qualidade de vida? No que pese a
tragédia decorrente da perda de tal energia e seus danos para a receita pública
e para o índice de qualidade de vida, o
empreendedorismo não sofre abalo; empresários com seu espírito de sobrevivência
continuam a montar empresas, o que coloca o empreendedor como um herói incansável.
Num país tão rico em Natureza, as perdas de energia fazem parte do conjunto de
desperdícios em todos os setores. Até mesmo os maus empresários, os que cedem à
corrupção , às tentações de burlar a competição, à mania de quere beneficiar-se
do Poder , certamente pensam, no fundo,
na preservação de seu negócio.
E assim vai o nosso país, como um caminhão lotado, perdendo carga até
chegar ao porto; dá pequenos saltos e avanços; parece brincar com o futuro;
parece reserva-se para algo maior talvez, mas sempre que se prepara para
ajustes sérios, os mesmos, quando realizados,
só servem para enfrentar mais uma crise .
O "local de trabalho, como visto, assunto de cada empresa,vai sendo
relegado para o segundo plano, pode até receber inovações materiais, mas
continua a ser o local onde o brasileiro tem a sua vida em primeiro lugar: um
local de passagem, de 8 a 10 horas por dia? Se a casa do cidadão é sua
fortaleza, porque ele volta do trabalho, todo dia, tão cansado, tão derrotado?
Após tantas horas de contrariedades, fazendo e vivendo num ambiente adverso, a
pessoa não leva para casa maus sentimentos que irão influenciar
relacionamentos?
E é no local de trabalho que coabitam os tipos humanos com seus
comportamentos, onde o ego é atiçado como meio de defesa para sobrevivência do
bruto, o intolerante, o radical, o inexperiente, o extremista, o inflexível
durante as fases da vida, o que por si só já é suficiente para fazer o clima de
permanente conflito,mas que quando submetido à pressão advinda da
incompetência, ineficiência, prejuízo
financeiro etc., facilmente vira o inferno diário, vindo a constituir o
laboratório infalível em geração de doenças, da
violência doméstica e de rua, da contrariedade, instigadora do ego
animal; é o germe do conflito certo contra o Próximo, fator de redução da vida.
Tudo contribui para menos qualidade, menos produção, menos impostos,
mais doenças, mais reclamações trabalhistas, mais prejuízos. É ou não é um
aspecto essencial para a Economia?
Todo o escrito acima não passa de uma platitude, mas o intuito é alertar
sobre mais um dos centros de onde surgem problemas graves, que são
determinantes para o crescimento
material e espiritual. Na sua pior fase, o local de trabalho é autocrático,
pragmático, frio, calculista, racional, individualista, utilitário, inflexível,
nada democrático quanto à produção e é também o meio onde o ego faz sua dança
entre os viventes, com muita disputa, competição, intolerância, truculência,
inflexibilidade, brutalidade, grosseria, quase nenhuma empatia, características
do egocentrismo, tudo circundado por muita mediocridade, desorganização pessoal
e coletiva, nivelamento por baixo, uma exigência de todo mundo ser igual numa
vontade de uniformização material e espiritual. É o caldo para a sujeira humana
diante de permanente contrariedade; ali
o dia é tocado à base de fofoca, maltrato,
assédio, traições, injustiças,
tudo para inervar a pessoa e mantê-la em estado de sofrimento,
retirando-lhe a boa energia. É o campo dos seguidores, sem opção de crescimento
intelectual. No meio surgem eventualmente criadores e idealizadores, mas que
logo são
sufocados em seus talentos. Ninguém se preocupa com a fuga de estudantes
para o exterior, como alto índice de turn-over, com uma juventude que
simplesmente não se interessa pelo trabalho em empresas?
Mas o campo é fértil para o
conserto, mesmo que lento e individualizado, através do trabalho do
treinamento, programas de inteligência emocional, meditação grupal, constelação
empresarial, criatividade de consultores, até ginástica de descompressão. Um bom local de trabalho ajuda a melhorar a
vida das pessoas e do país.
Eis aqui mais um ponto que deve ser levado em consideração como item dos
fundamentos da Economia e seu crescimento sustentável. O local de trabalho é em
verdade, pelo número de horas ali passadas, a casa do cidadão, embora quase
ninguém o entenda como tal. Sua
qualidade tem efeitos pessoais e coletivos. Todos devem trabalhar para chegar a
um nível melhor, a um local que não seja tão agressivo. Não é questão de dinheiro, de pleitear compensações
materiais pela insegurança, instabilidade, sofrimento e agonia; é questão de
saúde e de vida. Só mentes despreparadas pensam que por dinheiro vale vender a
vida. O esforço tem que ser de todos os humanos em construir o local onde não
seja exigido tanto ego, umbigo. Com o esforço de todos poder-se-á chegar a mais diálogo, estudo, esclarecimento, luz.
Odilon Reinhardt . 3.9.2019