terça-feira, 3 de setembro de 2019

Mais um centro esquecido III?









                                              Mais um centro esquecido III?


Banalizado quanto ao seu papel para a produção de qualidade, esquecido quanto ao seu status na qualidade da vida, o local de trabalho de milhões de pessoas vem, no entanto,  sofrendo as eventuais melhorias que os delegados de cada empreendedor decidem implantar,obedecendo sempre a racionalidade e o pragmatismo imposto do custo benefício. 
Não há uniformidade quanto ao que fazer para reduzir a agrura da realidade dos resultados frente à redução da produtividade ou do seu aumento mediante altos custos para a empresa e para todos que ali convivem, com reflexos para  o país. As soluções são individuais, submetidas a regras trabalhistas existentes, quase todas de natureza protecionista-paternalista, basicamente impregnadas do fundamento de que o empregado é uma nulidade e o empregador um explorador e sempre limitadas aos limites da lucratividade num ambiente de total insegurança e instabilidade, onde os Governos têm tido  sua participação sempre desastrada.  
O empreendedor, aquele que arriscou, endividou-se para criar empregos, para gerar renda e impostos, é visto como um explorador capitalista. Que ideologia leva a isto e fez a realidade retrógrada por tantas gerações? Que ideologia contribuiu para que o país permanecesse pequeno no seu pensar? 
O assunto é de interesse social, mas as iniciativas de melhoria e progresso serão sempre particulares na medida que o tema é visto como fator diferencial entre as empresas, cada uma com seus segredos na disputa  pelo sucesso no mercado. As práticas internas, com seus sucessos e insucessos, são assunto interno. Boas práticas no setor só são divulgadas até o limite que não revelem detalhes do segredo de cada empresa.  
Considerando a enorme quantidade de empreendimentos privados  e sua diversidade de organização e composição, uma crise econômica atiça a competição, mas não altera a visão errônea de que o local de trabalho em seus aspectos físicos e humanos é menos importante para os resultados da empresa, tanto assim é, que ,diante de qualquer financeira crise, o setor de treinamento é o primeiro a ser vitimado com cortes bruscos, bem como qualquer benefício para o humano.
E na crise permanente  do país, com o desemprego e seus efeitos, quem tem o privilégio de manter o emprego ou de conseguir um local de trabalho aceita qualquer condição, sujeita-se a tudo pelo salário salvador; aceita o local, suas mazelas e sua cultura, feita por pessoas que ali habitam e por tradicionais erros de organização, planejamento e um sistema de recursos humanos voltado ao cumprimento de rotinas trabalhistas e não verdadeiramente voltado aos humanos e sua inteligência.
Nem se ouse falar em correta motivação e sua sustentabilidade para tornar a empresa um centro de aprimoramento do ser humano. Evidentemente,  não se pode deixar de pensar nos  erros e intenções em prol da uniformidade e padronização, abarcando a todos como se iguais fossem, menosprezando suas diferenças. O que se pode objetivar no campo do ideal é que tantos erros contribuam para o surgimento de idéias que criem condições melhores a fim de possibilitar no local de trabalho, ou melhor dizendo, no "local de vida", a implantação progressiva de estímulos ao pensamento de prosperidade e libertação das ideologias erradas que até agora têm sido a estrutura da vida de miséria intelectual.
Gerentes e diretores administrativos, de variada educação e gama, tendem , de acordo com seu estilo gerencial, implantar sistemas e rotinas de pessoal, visando o treinamento, folha de pagamento, recrutamento e seleção etc., mas raramente têm sucesso no sistema de motivação e inteligência emocional. Isto ocorre, porque num ambiente altamente estressado, pragmático e racional, os aspectos humanos acabam sendo relevados e deixados em segundo plano, quer por desamor ao Próximo apesar de 519 anos de pregação católica, quer pela desorganização administrativa, a qual vive no sistema de gerenciamento de crise e eliminação e fogueiras, quer pelo conjunto da empresa e seus ocupantes que nunca deixam de espelhar os defeitos da própria sociedade a que pertencem.  
Não é incomum que o despreparo gerencial  adote técnicas erradas e estas venham a descambar para o estágio em que o recurso usado é manter o pessoal ameaçado, com mensagens de fusão empresarial, venda da empresa ( no setor público, a privatização), tudo para que as pessoas não reclamem, fiquem sempre acuadas e trabalhem mais, não tenham pretensões salariais maiores nos momentos de acordo coletivo etc., aceitem a administração como ela se apresenta, pois, tudo torna-se um esforço para salvar a empresa, o salário. É o ponto maquiavélico mais agressivo. O objetivo é manter a realidade sempre em perigo, em instabilidade.  Outra estratégia comum é pregar que lá fora no mercado tudo é muito pior. O pior é que do próprio pessoal,  são escolhidos pela gerência os formadores de opinião que devem plantar tais mensagens na rádio peão. Notícia ruim espalha-se com rapidez e quase nunca é negada.  
A maioria das empresas vive assim, ilhas de amargura, mas a produção continua sendo feita e vendida pelo que as nuances humanas são engolidas com farofa seca e relegadas ao drama do universo pessoal de cada pessoa. Mas quase sempre a evolução do problema recorrente leva a um ponto de estrangulamento e a organização adoece e exige,portanto, tratamento.
O empreendedor, diante dos números acusando queda de qualidade e das vendas, pergunta a si mesmo qual foi o erro.  É esta a mão de obra que o Governo prepara com seu danado sistema de Educação? São estes os cidadãos e o que fazem quando reunidos? Diante da margem de lucro comprometida, o que fazer para mudar a realidade? Este recurso é o fator negativo imutável que deve ser considerado  como constante no risco do negócio e do custo que o país apresenta?
No miudinho, foi falha do setor de admissão? Falhou a seleção? Geralmente, os problemas de pessoal e seu desenvolvimento são tidos como resposta às questões acima. Como  nenhum administrador é psicólogo ou psicanalista para fazer tratamento de pessoal, porque o caso é de grupo ou de massa, até uma análise organizacional raramente, apesar de propor, consegue resolver o problema instalado. O que se consegue é uma reengenharia de unidade, mas quase nunca melhorias para o "pessoal", um problema que se gera e se basta.
E com o passar do tempo, mesmo que algo novo tenha sido instalado,  tudo volta à estaca zero e nova análise é necessária, a preço de ouro, porque a produção está sendo afetada e o desempenho da empresa comprometida, mas a culpa é colocada no sistema utilizado, defasado, e nunca no pessoal, com se o material, as máquinas,etc., tivessem vida e a propriedade de gerar o mundo por si só. Esta visão puramente material cega a todos e impede soluções de fundo.
Diante da impossibilidade de resolver, em definitivo, o problema humano no local de trabalho, as empresas que possuem recursos, de tempos em tempos, continuam a sobreviver com ajustes, mas pecam nos fundamentos. As demais empresas vão sendo estranguladas até perder o mercado e fechar as portas, geralmente na falência. Perde o Brasil, perde o consumo-receita, perde o empresário, e muitos perdem o emprego. A questão é material?
Na cadência de aberturas e fechamentos de empresas, quanta energia é gasta? Quanto perde o país, quanto sofre a qualidade de vida? No que pese a tragédia decorrente da perda de tal energia e seus danos para a receita pública e para o  índice de qualidade de vida, o empreendedorismo não sofre abalo; empresários com seu espírito de sobrevivência continuam a montar empresas, o que coloca o empreendedor como um herói incansável. Num país tão rico em Natureza, as perdas de energia fazem parte do conjunto de desperdícios em todos os setores. Até mesmo os maus empresários, os que cedem à corrupção , às tentações de burlar a competição, à mania de quere beneficiar-se do Poder , certamente pensam, no fundo,  na preservação de seu negócio.
E assim vai o nosso país, como um caminhão lotado, perdendo carga até chegar ao porto; dá pequenos saltos e avanços; parece brincar com o futuro; parece reserva-se para algo maior talvez, mas sempre que se prepara para ajustes sérios, os mesmos, quando realizados,  só servem para enfrentar mais uma crise . 
O "local de trabalho, como visto, assunto de cada empresa,vai sendo relegado para o segundo plano, pode até receber inovações materiais, mas continua a ser o local onde o brasileiro tem a sua vida em primeiro lugar: um local de passagem, de 8 a 10 horas por dia? Se a casa do cidadão é sua fortaleza, porque ele volta do trabalho, todo dia, tão cansado, tão derrotado? Após tantas horas de contrariedades, fazendo e vivendo num ambiente adverso, a pessoa não leva para casa maus sentimentos que irão influenciar relacionamentos?     
E é no local de trabalho que coabitam os tipos humanos com seus comportamentos, onde o ego é atiçado como meio de defesa para sobrevivência do bruto, o intolerante, o radical, o inexperiente, o extremista, o inflexível durante as fases da vida, o que por si só já é suficiente para fazer o clima de permanente conflito,mas que quando submetido à pressão advinda da incompetência,  ineficiência, prejuízo financeiro etc., facilmente vira o inferno diário, vindo a constituir o laboratório infalível em geração de doenças, da  violência doméstica e de rua, da contrariedade, instigadora do ego animal; é o germe do conflito certo contra o Próximo, fator de redução da  vida.
Tudo contribui para menos qualidade, menos produção, menos impostos, mais doenças, mais reclamações trabalhistas, mais prejuízos. É ou não é um aspecto essencial para a Economia?
Todo o escrito acima não passa de uma platitude, mas o intuito é alertar sobre mais um dos centros de onde surgem problemas graves, que são determinantes para o  crescimento material e espiritual. Na sua pior fase, o local de trabalho é autocrático, pragmático, frio, calculista, racional, individualista, utilitário, inflexível, nada democrático quanto à produção e é também o meio onde o ego faz sua dança entre os viventes, com muita disputa, competição, intolerância, truculência, inflexibilidade, brutalidade, grosseria, quase nenhuma empatia, características do egocentrismo, tudo circundado por muita mediocridade, desorganização pessoal e coletiva, nivelamento por baixo, uma exigência de todo mundo ser igual numa vontade de uniformização material e espiritual. É o caldo para a sujeira humana diante de permanente  contrariedade; ali o dia é tocado à base de fofoca, maltrato,  assédio, traições, injustiças,  tudo para inervar a pessoa e mantê-la em estado de sofrimento, retirando-lhe a boa energia. É o campo dos seguidores, sem opção de crescimento intelectual. No meio surgem eventualmente criadores e idealizadores, mas que logo  são  sufocados em seus talentos. Ninguém se preocupa com a fuga de estudantes para o exterior, como alto índice de turn-over, com uma juventude que simplesmente não se interessa pelo trabalho em empresas? 
Mas o  campo é fértil para o conserto, mesmo que lento e individualizado, através do trabalho do treinamento, programas de inteligência emocional, meditação grupal, constelação empresarial, criatividade de consultores, até ginástica de descompressão.   Um bom local de trabalho ajuda a melhorar a vida das pessoas e do país.
Eis aqui mais um ponto que deve ser levado em consideração como item dos fundamentos da Economia e seu crescimento sustentável. O local de trabalho é em verdade, pelo número de horas ali passadas, a casa do cidadão, embora quase ninguém o entenda como tal.  Sua qualidade tem efeitos pessoais e coletivos. Todos devem trabalhar para chegar a um nível melhor, a um local que não seja tão agressivo.  Não é questão de dinheiro, de pleitear compensações materiais pela insegurança, instabilidade, sofrimento e agonia; é questão de saúde e de vida. Só mentes despreparadas pensam que por dinheiro vale vender a vida. O esforço tem que ser de todos os humanos em construir o local onde não seja exigido tanto ego, umbigo. Com o esforço de todos poder-se-á chegar a  mais diálogo, estudo, esclarecimento, luz.

Odilon Reinhardt . 3.9.2019