sábado, 3 de outubro de 2020

Exaustão

 

 


                                                 


 


                            

 

 Talvez.

 

Talvez , talvez agora,

o humano acorde

para pegar as lições dessa hora.

 

Talvez por seu visor

possa entender

que seu caminho já era desanimador.

 

Por que tanta falta de lucidez,

tanto produzir inutilidades,

tanta rapidez, tanta avidez?

 

Como humanos onde estávamos indo?

Havia algum compromisso,

algo que estava nos conduzindo, coagindo? 

 

Qual o prazo, era tudo por dinheiro,

competição, rivalidade, velocidade,

que justificasse aquela agonia o dia inteiro?

 

Cegos, inconscientes,

seguindo programações alheias sem saber,

ou sabendo, estávamos já abobados, dementes?

 

Talvez, talvez agora,

o humano entenda,

não há para onde ir embora.

 

Então para que tanta pressa, essa agonia,

euforia, frenesi de competição,

esta ansiedade, angústia? 

 

É como se estivéssemos nos justificando,

punindo por existir,

querendo provar algo para alguém que vamos imaginando.

 

O planeta é único, está só,

o humano foi premiado e está aqui,

aqui nasce, aqui virá pó. 

 

Suas construções materiais,

espirituais , cerimoniais são daqui.

Há do espaço outros locais e sinais?

 

Por que não se aceita a verdade,

por que não se redimensiona o jeito de conduzir,

de fazer o mundo e sua realidade? 

 

Alguma imbecilidade,

alguma ansiedade pessoal,

está conduzindo a Humanidade?

 

Criando marcos de ilusão,

falsos imãs e ícones do prosseguir,

antes a Lua , agora Marte , depois Plutão?

 

A formiga não se aceita,  quer ser elefante ;

o jacaré quer ser ave,

o humano quer ser burro? 

 

A ciência ilude e quer ir para fora,

mas não consegue vencer um vírus

que pode e quer matar a todos agora.

 

Em reuniões, lideranças

decidem gastar trilhões no Espaço,

e a Humanidade se ajoelha pedindo comida e vacina?

 

Que idiotice é essa

que empobrece , mata o Planeta

porque alguns têm uma ilusão dessa?

 

Mais de 700 milhões de humanos já se foram;

partiram sem entender;

há tantos por quês que nem perguntaram.

 

O que estamos vislumbrando?

Para quem estamos mentindo?

Por que vamos nos enganando?

 

Talvez seja a hora de quem restou perguntar:

“ o que estamos fazendo da existência ?”.

Talvez se possa ainda esse modo de vida repaginar.

 Odilon Reinhardt. 

 

 Como será ?

 

 Talvez muito desejo, sonho vontade,

com esta pandemia de 2020

  não ganha mais realidade.

 

Muita gente,

talvez ainda não tenha pensado

que muitas vontades ficarão só na mente.

 

A nova normalidade

talvez esteja eliminado

a vontade em sua essencialidade.

 

Para muitos há vontade

que dependendo da fase da vida

já foi ficou há muito tempo na impossibilidade.

 

O que sobrará do querer viajar,

Abraçar, encontrar, almoçar fora,

Andar na rua, comprar , estudar , cumprimentar?

 

Será que tais vontades

Resistirão ao novo normal

Só como memórias de antigs realidade?

 

Talvez si, talvez não,

para alguns , para outros,

dependerá do coração:?

 

No novo normal,

o que será anormal e como será

para cada mortal? 

 

Será que haverá

o novo normal ,

será ?

Odilon Reinhardt. 

 

 

Novo normal.

 

 

Sorrisos escondidos,

olhares estarrecidos,

rostos repartidos.

 

A máscara ,

os mascarados,

a realidade cara.

 

A expressão sem graça,

os olhos como contato,

a aparência em desgraça.

 

Olhos tristes, enternecidos,

irados, assustados,

feios, raivosos , cansados.

 

A máscara escondendo o rosto,

como a mulher de burka, de shador,

uma sombra sobretudo sem gosto.

 

A máscara do Covid-19,

fazendo a beleza feminina passar ,

um tempo,um 2020, sem que nada a renove.

 

Quando veremos os olhos se abrindo,

os rostos felizes e livres,

femininos mostrando beleza e sorrindo? 

 

Agora vale enfim a mulher

que seja inteligente,

mostrando seu mundo interno de bom ser.

 

Só ego e aparência,

isto agora não pega mais, 

doravante, vale a essência.

 

Por enquanto, olhos que procuram se aproximar,

de humanos que passam, que fogem, que desviam,

que se afastam , que se distanciam.

 

Onde estão os amigos,

todos mascarados agora,

se misturam aos inimigos?

 

Prossigo na esperança do amanhã,

quero encontrar os amigos,

um irmão, uma irmã.

 

Estão em algum lugar,

atrás de uma máscara qualquer,

o velho normal deve voltar.

Odilon Reinhardt.  

 

O grande baile.

 

 

O dos mascarados,

dos incógnitos,

dos desconhecidos.

 

É o grande baile a descoberto

em plena rua, nas praças , nas salas

e corredores, na cidade a céu aberto.

 

Passantes dançarinos em máscaras coloridas,

brancas , pretas, coloridas,

por cima de caras escondidas. 

 

Elemento nivelador,

esconde sorrisos , beleza, caros cosméticos;

desolador. 

 

Riquezas e bens acumulados,

sem ponto de identificação,sem reconhecimento ,

exposição falida no meio dos igualados.

 

Conhecidos e desconhecidos

desviam-se, ágeis  em passos no salão,  escondem-se,

são todos agitados  passantes.

 

Ficou sendo o grande baile da democracia,

também baile do medo, da incerteza, do risco,

o “festim” farsante que vai pelo dia .

 

No meio há pessoas sem máscaras,

parecem estar nus, absortos , anormais;

olhos estarrecidos apagam suas caras.

 

A música e o ritmo são dados

dentro da cabeça de cada um

pelo soar dos problemas ali instalados.

 

Alguns com fanfarras e tambores,

outros com zunidos ,

muitos com silenciosas dores.

 

Vão todos dançando em passos de solidão,

carregando seu distanciamento,

empurrando suas mentes em exaustão.

 

A vida segue constrangida,

açodada , incerta, para  o dia, 

mas rápida e perseguida.

 

Sensação de vida suspensa,

um tempo entre parêntesis,

a loto da saúde por única recompensa.

 

E segue o baile pelo corredor das rotinas,

alguns bem trilhados e desgastados ,

é assim pelas ruas e suas esquinas.

 

O grande sarau da cidade,

o novo normal,

máscaras da realidade.

 

Milhares de inseguros resilientes,

vivem os incertos momentos de liberdade

presos em máscaras como meros sobreviventes. 

 Odilon Reinhardt. 

 

 

De repente.

 

 

E saíram pela rua,

estavam soltos, livres, sem máscaras,

conforme ideia só sua.

 

Haviam, por si mesmo, decretado

que não havia mais peste

e estava tudo liberado.

 

Preencheram praças e ruas,

praias e bares, avenidas cheias de sol;

ignoravam as verdades mais cruas.

 

Mas assustados, tinham olhares desequilibrados,

parecia que nunca haviam visto a vida e o mundo,

tal sua dedicação às coisas e bens desejados.

 

Procuravam algum conhecido,

amigos, parentes, colegas, vizinhos,

mas muitos já se tinham ido.

 

Muitos se escondiam assustados,

por trás de máscaras e bonés pensando ser invisíveis;

desviavam-se como aloprados.

 

Olhavam-se como sobreviventes,

portavam olhos curiosos

como que dementes.

 

Esbranquecidos, com cabelos crescidos,

aparência descuidada, não pensavam mais,

no tempo que os fez enlouquecidos.

 

Era, enfim, o momento de burrice de rebanho.

Diante da exaustão,

era até compreensível o ímpeto arriscado e tacanho.

 

Faziam uma marcha desorganizada,

avançando cada um contra seu moinho de vento,

o tirano virulento desta época tresloucada.

 Odilon Reinhardt.

 

 

Todo processo histórico tem construção de começo, meio e fim; mas sem efeito humano razoável que leve à felicidade pessoal e/ou coletiva, acaba criando o caldo propício para a exaustão, que o faz desaparecer ou, com mais frequência, ir adaptando-se às necessidades da população.  No passo do tempo, isto ocorre em suave transição ou, então, é intensificado por evento inusitado que faz com que todo o sistema de vida seja colocado em julgamento. Inúmeras vezes, a História da Humanidade chegou a estas esquinas do tempo em que a civilização construiu novo rumo e novo horizonte.  Num mundo muito menor, isto era obtido por vários meios, mas moldado por poucas cabeças, geralmente europeias e dentro de filosofias que eram coerentes com o comércio. Com o progressivo aumento de interesses por dinheiro, muitas de tais mudanças ocorreram após guerras sangrentas pela luta de espaço e poder. Agora com o gigante aumento da população, a Humanidade defronta-se em 2020 com o invisível, um vírus matador, que veio na hora em que o sistema de vida e produção já vinham sendo lentamente questionados, especialmente pela juventude, herdeira da vida e das consequências do sistema produtivo dos últimos tempos. Que novo modo de vida, de produção, de consumo, de política etc. começará a ser pensado após esta dura realidade do Covid 19-20-....? Que mentalidade, que filosofia, garantirá o sistema de vida e produção doravante? O interesse comercial é que ditará filosofias e modos de pensar e de fazer a vida? Que novo processo estará sendo iniciado? Haverá terras que ficarão no passado e outras em níveis quase futuristas?

Seja lá como for, a Humanidade ( desta vez, não tanto modelada diretamente por cabeças europeias ou mesmo americanas) achará um novo meio de sobrevivência a nível pessoal e coletiva. O que e como a juventude já está construindo ou levada a construir para sua época no Poder? Talvez o poder econômico e o interesse de dinheiro ainda tenham voz forte como até agora para ditar caminhos e modelos de comércio e produção, mas não de vida humana. É uma interrogação que fica em aberto. O tempo é que mostrará como isto irá tornando-se realidade. Por ora, o que se pode fazer é observar o processo de exaustão pessoal a que a população está sendo submetida neste encontro entre o presente e o futuro, onde a sorte e o destino parecem ser os únicos itens concretos do dia.   

O fato é que os dias passaram a ser dominados por muita notícia de desalento e desestabilização e isso por muito tempo contínuo, sufocando as pessoas e seus projetos. Estão sendo criadas condições para um evento chamado   Exaustão pessoal. Rápido demais, pois com sete meses de Pandemia, já se atingiu este estágio perigoso. Claro indício de que o movimento já vinha sendo instalado.  Em tal situação, observa-se o processo que impulsiona tendências de comportamento que não são bem o “novo normal” criado pelo “mercado”, afoito sempre em denominar e classificar eventos para enquadrá-los em seus interesses, pelo que o denominado “novo normal” é uma tentativa de padronizar hábitos e costumes, mantendo o controle do rebanho, todavia, as aglomerações que começaram a ocorrer durante a Pandemia já denotam que o povo continuará como era normal. No entanto, tudo o que já era tendência foi acelerado e a população mesmo com a volta de seus hábitos e costumes poderá sair deste evento pandêmico com mais intolerância quanto ao que já estava considerando digno de mudança. Assim, a Exaustão pessoal contribuirá para o agravamento e contestação de processos econômicos e políticos que vem se desgastando ao longo de décadas. A esquina de História ficará mais próxima e com muitas necessidades de mudança nos meios de organização coletiva. No entanto nenhuma mudança súbita é esperada.

No contexto formado por distanciamento, quarentena, uso de máscaras, reclusão social, afastamento, solidão, casos e mortes contados a toda hora, descontinuidade da rotina normal, perda de parentes e conhecidos, medo e insegurança, falências comerciais e diminuição de rendimentos e lucros, o abre e fecha do comércio, notícias contraditórias e manipulações numéricas, “fake news”, politicagem e corrupção, o humano, estarrecido e impotente, recolheu-se para seu umbigo, esperando e tendo fé em alguma solução de médio e longo prazo, o que contrasta com a ansiedade e desejo de rapidez em tudo.Esperam a vacina como elemento libertador? Muitos sabem que nada há de concreto quanto à durabilidade dos efeitos e o tempo de cobertura, e ainda não se fala em remédio correto para combate do vírus, o qual pode mutar e apresentar-se em novas versões nos próximos anos como a gripe. Infelizmente, o vírus não conhece nada das coisas humanas e faz sua dança diária, ceifando vidas e oportunidades. Os sinais de esmorecimento aparecem e o humano apresenta-se desestimulado perante a demora da volta ao normal de sua vida. Comerciantes acumulam dívidas e estão sempre para decidir se desistem ou não de seus negócios.  Assim, o desestimulo pessoal criado pela crise junta-se,  então, a outro mais antigo e bem comum nas últimas décadas brasileiras, o qual se refere ao sistema como um todo que gera o abandono devido a uma falta de imã, de modelo, de objetivo de prosperidade a ser obtido pelo trabalho honesto, decorrente do esforço de cada cidadão e que reflita seu estudo e talento desenvolvido em condições de excelência. O Brasil, com seus inúmeros problemas e contraditórias prioridades, deixou de criar condições de prosperidade pessoal, passando a cuidar do básico, a mera sobrevivência. Quantos jovens são “sepultados” todos os anos com referência a seus planos de vida?  Décadas e décadas de negligência quanto à educação formal de qualidade não reduziram o analfabetismo, não incentivaram talentos, não impulsionaram ninguém para a prosperidade sustentável. Hoje e no passado recente, somos o país onde pouco se lê e nada se escreve. Sem educação num ambiente de progresso e estímulo, todos os dias o Brasil dá tchau para jovens que queriam ser algo na vida, seja médico, engenheiro, advogado, técnico, artista seja quanto a milhares de outras vocações. Os resultados do Enem refletem a Educação que vemos, um fracasso. O que pensam os professores que se dedicam a vida inteira a ensinar e vem que os resultados são pífios. Como se sente um jovem que “queria ser “mas  ficou condenado no intervalo entre “o ser e o estar”? Que frustração eles levam para vida? Como ela se reflete no caminho mental e destrói relacionamentos? O que dizer dos poucos bem formados nas melhores escolas e universidades daqui e do exterior, que não conseguem exercer nada por falta de condições do mercado de trabalho, frequentemente diminuído pela mediocridade e falta de espaço para progredir?  E esses jovens não tem família, não se preocupam com o tempo passando? O fato é que muitos jovens, embora, pelos meios de informática, mais alertas, já entenderam que não haverá condições de sucesso, prosperidade para a sua vida e já “jogaram a toalha.” Vão assim assumindo outras funções com menos graça, menos estímulo para ganhar dinheiro, e sem chance de exercer seu talento. Desnecessário mencionar a insatisfação e descontentamento que isto causa. Logo descamba para algum tipo de abandono pessoal. Ademais é de se questionar como e quando o sistema educacional público ou privado estará preparando jovens para ocuparem locais de trabalho atendendo a requisitos no todo ou em parte dentro dos novos desafios dos empregos no mercado de trabalho como: pensamento analítico e inovação, criatividade, originalidade, iniciativa, pensamento crítico e capacidade de análise, liderança, influência social, capacidade de resolver problemas, interesse em aprendizado ativo e em ter estratégias de aprendizado, raciocínio e ideação, capacidade de design de tecnologia e programação, inteligência emocional. Uma lista que mais parece um rol de imaginárias situações. Se alguém reunir duas ou três dessas condições já será um rei, só faltará achar o local para reinar sem competição e rivalidade, sem guerra de egos e as misérias do mundo dos empregos.  Pelo que parece o país é para poucos e os empregos para bem poucos.

Por falta de um imã de progresso, de um modelo positivo a seguir, o negativismo toma conta e torna-se uma praga. Será que um jovem que faz tatuagem de uma imagem do diabo nas costas ou algo parecido, não exerceu esta escolha como reflexo de algo que tem na mente? Que sistema vem  estimulando tal opção de pintar-se com figuras diabólicas ou digamos da dimensão mais exotérica negativa?  Parece só algo superficial, mas pode não ser. Pode ser uma manifestação do abandono, do desestimulo, da insatisfação, do ato de ter desistido, ou seja, jogado a toalha? Um tipo de revolta interior, uma silenciosa contestação? Mas as consequências continuam na cabeça dos jovens e um dia 1968 poderá ser reeditado, pois a velha e desgastada frase ” isso é assim mesmo” parece que vai perdendo lugar com mais rapidez. Como será o novo 1968?   

O caldo em que a vida nacional tem se desenvolvido vem sistematicamente recebendo, ao longo de décadas, ingredientes bem ruins e que não motivam ninguém a acreditar em um projeto sustentável para si ou para o país. E como descartar a influência já bem adiantada do individualismo, do pragmatismo, do utilitarismo no comportamento da juventude e da população que têm demonstrado alto nível de intolerância, egoísmo, prepotência , violência mortal e física etc., como resultado de uma necessidade pessoal de busca de identidade e reconhecimento, dois alvos difíceis de serem acertados no crescente anonimato da cidade e das redes sociais? Sem um imã de progresso e sem um ambiente de bom desenvolvimento, o país afasta-se do mundo desenvolvido, e gera um hiato na Educação e na Ciência, criando vínculos de dependência secular. Se vamos ser a lavoura do mundo, seremos dependentes de tudo para plantar, colher e comercializar. Se vamos priorizar a mão de obra bruta e cheia de tarefas, vamos investir nos músculos, mas não no cérebro, gerando muitos obstáculos para o futuro. Se vamos focar na quantidade de grãos e pedras, enfraquecer a indústria nacional, vamos abandonar a qualidade e gerar mais importação a ser paga pelas exportações, mantendo a possibilidade de aumento da riqueza a níveis mínimos ( não se pode esquecer que apostar todas as fichas no agronegócio coloca o país como refém do meio ambiente e todos os eventos que nele podem ocorrer com seca, fogo, chuva, pestes, ciclones etc.).  Nota-se que vários são os fatores pelos quais vários setores tentam escapar das consequências de uma mão de obra negligenciada ao longo dos anos. Não deixa de ser uma estratégia para fugir do analfabetismo, deixando claro que a Educação não será a prioridade, perpetuando assim a condição de um povo sem instrução, seguidor, fácil de manipular, sem critica e sem esclarecimento, alienado, dependente da continuação de pequenos ofícios e tarefas que em muitos lugares do mundo não existirão mais, tudo para garantir um emprego, um salário, uma vida condenada a ser pequena.  Até que ponto o desconhecimento das estruturas formais do Estado e das leis, das instituições e todo o aparelhamento de órgãos não mantêm uma sistemática condição de clientelismo do eleitorado, contribuindo para a continuidade da classe política sem qualquer contestação, tudo como nos antigos tempos do voto de cabresto?   Afinal, os negócios públicos precisam continuar na mão de poucos, embora a TV diariamente insista que algo está errado e errado há muito tempo. Todavia, o discernimento popular não atinge tal mensagem diretamente. Mesmo assim, ao longo do tempo vai sendo criada uma ideia generalizada de que o Leviatã federal, estadual e municipal tem seus castelos e que esses não são do povo nem para povo, pois é um mundo à parte, lá no topo da montanha, onde só um tipo de gente pode persistir. E como desdizer isto e dar crédito às autoridades que mesmo durante a Pandemia continuam na corrupção, verdadeiras quadrilhas que assaltam os cofres públicos e desviam verbas para seus caixas dois, três, quatro...., sabendo que há gente morrendo aos montões? Que tipo de gente é esta e que país é este que durante décadas não muda e não favorece a Pátria?

Diante desta miséria de realidade e da impossibilidade cada vez maior de um voto vir a valer alguma coisa, da inviabilidade de participar e ser ouvido, da improbabilidade de poder participar da economia moderna e das profissões que favoreçam o talento pessoal, da falta de discernimento para entender a realidade complexa e filtrar a manipulação televisiva, o rebanho acaba virando as costas e segue por si só. Surge a vida nacional paralela, a da economia informal, dos negócios à margem da fiscalização tributária, da aparência de legalidade. Não que seja necessariamente criminosa, mas tudo informal, longe do Governo e da TV. O rebanho segue sem o controle de ninguém a não ser de seu próprio instinto. Fica para estourar quando as condições de bolso pioram a realidade fisiológica a que foi submetido. Assim, o país veste sua máscara, tem duas caras ou mais e não encara a realidade para curar-se. E se um dado Governo em dada época persiste em colocar máscaras em problemas cruciais para se proteger da oposição e das críticas que possam ter efeito eleitoreiro, nenhum progresso é atingido e continuamos todos mascarados, mesmo que um dia a máscara contra o Covid não seja mais necessária.

Assim, ao ignorar ou menosprezar o fator humano, a população reage e cria seu modo de vida para sobreviver. Não quer pagar impostos, não quer dar dinheiro para o Governo porque não acredita mais. Não é mais o caso esporádico de desobediência civil, mas a intensificação de algo muito mais grave, a Desconsideração civil.  De costas para a legalidade, para a formalidade e população ou substancial parte dela entra num estágio perigoso para poder sobreviver. Não é o caso de não seguir a lei, é o estágio de não conhecê-la e de prosseguir livre, como num estado anarquista.  Não é esta a vida dos milhares de cidadãos nos bairros com seus negócios e vida normal, onde só o instinto, o bom senso e a experiência de cada um rege a vida? A exclusão voluntária leva à perda fiscal de bilhões de reais que passam de mão em mão sem qualquer notícia de oficialidade. Há uma evasão fiscal enorme e que circula nas periferias porque não se considera o Estado e suas leis, seus complexos meios de organização e exigências para a formalidade, dezenas de tributos e guias, uma burocracia impossível de ser atendida por várias razões, dentre elas o mero analfabetismo. O Leviatã gordo e ineficaz quer seja Estado, Prefeitura ou União pouco penetra nas periferias, não chega no bairro, só existe na TV, não faz parte da vida do povo e a ele pouco interessa. Se consegue entrar, é com a polícia e ali nunca permanece. Afinal, Governo é coisa de político e não do cidadão. E neste caminho, certamente, surge com mais gravidade a ilegalidade, os expertos, os inteligentes e rápidos estrategistas do crime, mesmo do caixa dois, da milícia, das estruturas do tráfico de drogas, do crime organizado e suas facções e desdobramentos. Seja lá como for uma organização social, sem registro e à parte, fazendo um Brasil marginal, mas presente, real, que vive na inexistência civil?  É necessário que paremos de mentir, de esconder problemas e escamotear a realidade para que os antigos modos de fazer política e comercializar votos no Congresso, nas Assembleias e nas Câmaras de vereadores admitam a realidade e comecem a melhorar o país com sustentabilidade. Caso contrário, o hiato entre povo e Governo vai aumentar, não haverá quem dê crédito ao Governo e suas intenções de Leviatã egoísta, gordo, atrapalhado, desentrosado em seus níveis. Ninguém pagará imposto de livre e espontânea vontade como cidadão consciente, se não puder escapar da tributação. Ninguém mais prestará atenção nas TVs para continuar vendo corrupção e um festival de incoerências e coisas que não pode entender, mas que só azucrinam a vida e perturbam o dia. Aumentará substancialmente o número de pessoas que decidem se alienar, viver sem política, sem TV, sem nada de coletivo, só sua vida e seu umbigo. No estágio de desconsideração, as pessoas vivem à parte, não seguem a legislação, não procuram se informar, só vivem no rebanho e o seguem. Acham este meio de felicidade e paz. Isto já não explica as atitudes da população quanto às medidas contra a Pandemia? Quantos da população nem sabem o que é um vírus? Até hoje 3.10.20, o vírus já infectou 34.650.936 pessoas no mundo e matou 1.029.128 outras e no Brasil foram mais de 145 mil.

Esta vida de desconsideração civil implica novas realidades em vários setores. Observe-se o que acontece na população menos favorecida não só quanto a atividade econômica, mas quanto a relacionamentos, casamentos informais , filiação, violências de todo tipo, uma verdadeira bagunça em termos do que seria o legal e o certo.  A sociedade se esforça para manter instituições, a lei e toda a formalidade, mas as condições que levam à informalidade são mais rápidas e continuam gerando um Brasil paralelo, informal que talvez seja o real, o Brasil de verdade, o que existe no dia a dia, e que resulta de séculos de corrupção, analfabetismo, onde tudo é tão informal, fisiológico, básico, pobre, endividado, primitivo, egoísta, com cara e olhos de perdedor, com cara de culpado, com pessoas empurrando a vida, mas grande e numeroso, socialmente perigoso e sujeito a políticas de momento que acabam aumentando a exaustão desse tipo de cidadania, pois quem não cansa de sofrer, de dar a vida ao nada e indignar-se com serviço público deficiente, que pouco socorre seus parentes e familiares, que vê os impostos serem mal utilizados, que vê a impunidade continuando e a lei trazendo benefícios em prol do dinheiro de alguns. Repita-se, falta um imã de progresso maior.  Hábitos e costumes sempre vêm demonstrando um contexto de desistência como espírito de entrega. E assim os dias são preenchidos à margem, na informalidade, sem muito comprometimento com a persistência da própria vida. Há sinais de fuga constante. Com a Pandemia tudo vem à tona com mais clareza e o Leviatã da União joga tudo para o Estado e este para a carcomida Prefeitura. O fato é que a exaustão criada pelo Covid une-se a essa exaustão do sistema. Pode haver o nascimento de soluções boas e que marquem uma reviravolta quanto à coisa pública e a população, como também, pode haver um descarrilhamento, podendo precipitar movimentos negativos, mesmo que a fé cristã ainda impere e faça com que sejamos um povo pacífico e que tolera tudo. Não sabemos como a Economia vai receber o impacto de crise mundial, qual a miséria que virá ainda maior, mas é relevante que se observe a população e leve-se em conta esta tendência de desconsideração civil e seus efeitos sociais e econômicos. Cada cidadão já começa a pagar a conta feita pelo Covid. Direta ou indiretamente, a inflação e as mediadas econômicas para asseguras a vida do Leviatã vão afetar a vida como ela é hoje. Como será controlada a inflação sem aumentar os juros? Como crescer com juros altos? 

Diga-se, a miséria de hoje não é só a material, está no modo de pensar, na ideologia vaga da mediocridade que separa e exige uma igualdade social impossível de causar felicidade e bem estar; vive na raiva social, que só causa contrariedade e violência, esta em várias modalidades, prepotência, abuso de poder etc. A miséria se alimenta da falta de objetivo de prosperidade e um clima coletivo de desenvolvimento pessoal, fazendo o país mergulha nessa miséria intelectual; o país torna-se oral, superficial, dependente e a vida passa a nortear-se pelas necessidades pequenas do mero sobreviver ao dia, de vencer na luta pelo material e sempre com olhos ruins contra quem tem algo, mesmo que só por aparência, fazendo nascer um mascarado apartheid.

520 anos de existência e nosso gigantismo pesa e exige inteligência e novos sistemas em tudo, senão continuaremos retrocedendo e perdendo energia, a caminho da tribo original, onde cada indivíduo é por si só o chefe, alheio ao Estado, à estrutura formal num império de falta de tudo, mas um indivíduo solto, livre como a rês que nasce no meio do rebanho e o dono da fazenda nem sabe de sua existência, mas quando esse se dá por si, há mais desgarrados do que cabeças contadas e ele não sabe do estouro que pode haver contra suas cercas e instalações. Só usar a TV para “controlar” a população pode ser uma estratégia e meio desgastados, devendo-se lembra sempre da passeata inicial em São Paulo, em 2013, que surgiu de uma simples reivindicação de preço de ônibus e sua espontaneidade e gigantismo pegaram a TV e toda a mídia de surpresa; não sabiam nem o que estava acontecendo, já que se ocupavam só com as notícias do Governo e a política.

Portanto, os dois tipos de Exaustão agora unidos podem criar muitos fatos novos a serem observados e questionados, todavia, causam já muita preocupação e a vontade de que as autoridades acordem, deixem a velha política de lado e procurem inovação no modo de cuidar deste brilhante e rico Brasil. É a Esperança e a Fé de sempre. Nada de violência, só soluções inteligentes, debate, diálogo e  amor ao Próximo, ao Planeta, à Vida e à Pátria.

No perigoso jogo de direita e esquerda, o pior é ficar empacado e não ir a lugar algum para frente, o que exige Educação, inteligência, ciência, para fugir da escravidão, sem cor, que é a da dependência das terras que se dizem mais adiantadas.

Quanto a está tendência de exaustão do sistema, a questão é quantos de nós, de todas as classes sociais, não está virando as costas para certos assuntos e para o “modus vivendi” do Estado em seus níveis? Nunca se pode esquecer que, se a TV não mostrar ou mencionar, nada existe e de nada sabemos, e o Estado continua no seu castelo progressivamente também nos virando as costas, mas fazendo pagar a conta.

 Odilon Reinhardt. 3.10.20.