Rua e ruas .
Não é a rua
onde as gentes se encontram
e por ela desfila a realidade nua?
Encontros ,
idas e vindas,
hoje desencontros?
Ruas com seus passados
motivos
de orgulho pessoal e coletivo,
tempos ultrapassados?
Rua e ruas por onde passa o Universo,
desfilam
o sol e a chuva , o inverno e o
verão,
a vida de um e de todos , motivo de heroico
verso?
Tudo passa pela rua,
a vida e a morte,
hoje o medo e a confiança insegura.
Quem anda hoje pela rua livremente?
Todos levam em si a paranoia moderna,
um cupim que em
todos anda pela mente .
Odilon Reinhardt.
Estamos montando cenários de H.P.
Lovercraft nas ruas?
Cenas do Brasil cotidiano, já banalizadas, estão
compondo cenários humanos e reais que assustariam H.P. Lovercraft ,o autor do
início do século passado, que com suas estórias de terror em locais
imaginários, inspirou com suas imagens o
mundo de contestação na música, cinema, literatura com imagens monstruosas de
personagens e locais horrendos. Tudo hoje já integrado ao imaginário de
adolescentes e adultos das últimas gerações que tatuam seus corpos com figuras
igualmente contestadoras. Se em todos tal visual se reproduz em comportamento
revoltado ou é só alegoria , ainda fica como pergunta .
Aqui, no nosso canto do Universo, os cenários humanos, são repetidos e sua
vulgarização ocorre inevitavelmente. Todavia, passam a compor um quadro
restritivo do ir e vir, da liberdade do cidadão e vão diminuindo a qualidade de
vida face ao medo, desconfiança e à sensação horrível da insegurança social
generalizada, movida por ódio ao Semelhante e vontade de desabafar em alguém,
pretensamente tido como culpado pelas mazelas individuais do agressor.
Se os fatos mais corriqueiros deste país acontecessem na mesma rua ou cidade, a situação seria bem dos cenários de Lovercraft e de caos do Armagedom. Observe-se a coletânea a seguir exposta, reunida com muita facilidade, muitas durante os últimos dois meses. Pode até ser que estes casos que apareceram na mídia a título de sensacionalismo, sejam exceções, mas deve-se lembrar que, grandes impérios de hoje, como o do crime, começaram com exceções, por exemplo, o império das drogas, que começou com o uso de lança –perfume no carnaval , boletas vindas pela fronteiras com Foz do Iguaçu. A seguir, observe-se os fatos na rua dos Horrores, aqui hipoteticamente imaginada , mas preenchida com fatos bem reais:
- em um trecho da rua, há um cara, deitado sobre os fios, cortando os mesmos com os dentes. Após o ato, enrola tudo e sai andando normalmente.
- uma gangue assalta um jovem casal, para roubar as roupas e celular. Os malfeitores saem rindo.
- um grupo de traficantes põe fogo em uma farmácia popular , ônibus e supermercado e sai atirando .
- um ladrão rouba faróis e pneus de um carro importado, sem medo das câmeras, e sai sorrindo para a companheira que tudo assiste.
- um ex-marido entra no salão de beleza para matar a esposa, que escapa; o cara se retira ameaçando a todos.
- motorista freia o carro na frente do barzinho e começa disparar tiros e vai embora. Atinge dois que morrem.
- gang sequestra carro com bebê do banco de trás e sai arrastando a mulher pela rua .
- um grupo de turistas é assaltado e os populares ficam olhando da calçada, como se o fato fosse ligado a algum tipo de justiça social .Nenhum dissabor.
- um carro passa em frente à delegacia de
polícia metralhando. Algo que não é mais assustador.
- num apartamento, uma menina morre com bala perdida. Desesperador.
- na esquina , o encapuzado vende droga à luz do dia sem qualquer problema . Não há temor.
- numa casa, a polícia está ano portão para negociar a soltura da mulher, feita refém pelo marido. Horas de terror.
- pela rua vai passando um carro alegórico a caminho da avenida para desfilar com figura de “ Lampião” . Apologia? Nada anormal?
- uma moto com garupa atira em morador que chegava em casa e foge sem identificação. Já bem normal. Ajuste de contas, cobrança.
- uma mocinha recebe uma caixa de bombons envenenados, como vingança pelo namoro desfeito. Desamor.
- no ponto de ônibus, a moça morre atropelada pelo caminhão de entregas e o motorista nem sai do veículo de tão bêbado. Destino alcoólico?
- no endereço tal, casa 3, fundos, funciona uma pequena oficina de falsificação de medicamentos. O caminhão sai e entra sem qualquer dificuldade. Crime diabólico.
- o médico se desentende com a esposa e a joga pela janela do prédio. Ataque egoico.
- um motorista bêbado joga o carro contra mesa na calçada, onde estivera com parentes, tentando atingi-los devido a questões familiares. Fisiológico.
-O caminhão dos Correios é saqueado no bairro pela população. Algo banal.
-A rua vai só até um pedaço, dali em frente só entra quem paga pedágio para a milícia, que domina o bairro seguinte. Ponto final.
-Vizinho mata adolescente por causa do som alto. Tresloucado.
-Arrombamentos, roubos de celular, bicicletas, já são do cotidiano. Acontecem a toda hora. Cidadão refém do dia salteador.
-Pai mata esposa na frente da filha na entrada do colégio. Cruel matador.
- Motorista de caminhão percorre mais de 100 km e entra na capital cometendo acidentes propositais . Verdadeiro tanque de guerra.
- Motorista de ônibus dorme e mata 7 viajantes . Acorda e diz” dormi”. Anjo dos infernos.
- Na TV alguém lança fato acusatório contra autoridade e muda a versão por mais de três vezes. Problema de essência?
- Num parte da rua tudo é atacado por grupos criminosos. Incêndios , tiroteios, ataques a prédios públicos. Tudo como protesto contra decisão judicial. Tipo novo de apelação criminal?
- Na esquina, um ônibus é incendiado por protesto contra o motorista que atropelou o cachorro. Muito louco.
- Cliente do posto de gasolina desentende-se com frentista e este lhe joga gasolina e ateia fogo. Tudo muito louco.
- No posto da esquina, cliente se cria caso com um grupo de pessoas, pega a arma no carro e volta para atirar, matando vários. Loucura .
- Em algum lugar da rua, todo mundo sai correndo da escola infantil, onde um adolescente pulou o muro vestido de coelho e começou a matar crianças com uma faca. O caso precedente é o adolescente que entrou na escola e com uma machadinha matou 4 crianças. Inspiração diabólica.
- um Juiz de Direito é preso por abuso físico e moral contra a esposa. Mente imatura?
- a menininha voltava da escola e bandidos e encontra tiroteio entre bandidos . Não pode escapar da bala perdida. Destino?
- na escola, a professor manda as crianças deitarem no chão devido a tiros na vizinhança. Lições valiosas?
- numa Unidade de Saúde, um cidadão entra e esfaqueia várias pessoas a esmo. É morto pela polícia. Doideira.
- correria na esquina, onde um grupo faz arrastão em farmácia e supermercado.
- através de bueiro , dois larápios cortam fios e deixam 4000 pessoas sem internet. Individualismo?
- numa rua transversal , drogados enchem as calçadas, o comércio desiste da região, os moradores ficam trancados no prédio sem luz por causa do roubo de fios elétricos há dois dias.
E quando a noite chega, a rua se transforma em boate ao céu aberto. Nem se fale nas explosões a caixas eletrônicos.
E teria muito mais, todavia falta rua para tantos casos. Rua já inteiramente decorada por pichações. Show da vida.
E assim vai a rua no seu dia a dia . E sabe-se
lá o que corre por trás das portas fechadas nos relacionamentos familiares e de
intimidade. Segregados horrores, dissabores, sufocadas dores.
“O país está doente” vaticinou o falecido
ministro Theory Sawatsky. Está doente no físico e no mental.
Exceções de hoje, de ontem, de dois anos atrás? Sementes do amanhã. Basta lembrar que o famoso “jeitinho brasileiro” era a romantizada semente da corrupção que acabou em escândalos gigantescos. O trote telefônico era brincadeira, mas evoluiu para “fake news” devastadora. Quem deixa a erva daninha se espraiar arrisca, perder a colheita. Sementes de hoje, árvores do amanhã.
Odilon Reinhardt. 3.5.23