sexta-feira, 3 de outubro de 2025

Ela está ainda lactente II

 


 

 





Ela está ainda lactente II.




Cacos escolhidos

 

 

pela realidade televisiva,

coletânea de pontas de iceberg,

pedaços da vida ativa;

 

a mídia não faz notícia,

mas escolhe cacos sensacionais

para invadir a casa alheia todo dia;

 

que tipo de visão de mundo,

produz o show de distorcidas exceções

que nunca vai em nada a fundo?

 

A perturbação da vida comum,

agitação estressante do caleidoscópio,

inevitável ataque a mente de cada um;

 

resulta no desligar,

na alienação ou revolta, pessimismo; 

mas fim de pelo menos uma fonte do manipular.

 

No que isso contribui

para o processo democrático

nessa etapa que surgiu?

 

Superficialidade

para o discernimento sofrível,

qual a verdadeira realidade?

 

 

E é no campo das conversas que tudo se intensifica com a miséria intelectual dos conteúdos vazios. A pobreza intelectual campeia. O tema da conversa e o seu desenvolver, a superficialidade explícita. A simplicidade mora na virtude, mas não nesse tipo de simples ignorante e obscuro que vai do futebol, carros e qualidade de cerveja como campo onde os intelectos hodiernos se encontram. Aqui não existe “jogar conversa fora”, pois a conversa já nasce jogada. Realidade que é transferida para outros locais oficiais ou não, onde o diálogo é todo mascarado por interesses umbilicais, cheio de segundas intenções e coberto pelos cabrestos e máscaras do dia.

 

Tal realidade, gerada pelas pessoas em mal vida, é transferida para vários locais, sendo a oficial a mais televisionada, onde a política aberta, revela o amontoado de interesses pessoais, colocados e impulsionados por totalitarismo autêntico, de raiz nascida do popular, construção egóica, modo de vida e poder em qualquer lugar.

 

Sua prática diária vive da violência impulsiva do ego de cada um;  exprime-se bem à vontade na inflexibilidade, intolerância, preconceito, conservadorismo e faz o radicalismo das ações e reações no ato de evitar debate e discussão, diálogo que exponha a contrariedade.  É a democracia da maioria egóica que anda do bar à fábrica, da casa ao palácio, da cozinha à cama, da buzinada ao xingamento e cala-boca.

 

O processo de diálogo é conduzido pelos interesses em jogo. Se o interesse é defender um assunto de esquemas de poder e seu financiamento etc., o poder se manifesta e bloqueia por vários meios qualquer oposição ou escamoteia o processo de debate , usando modos indiretos de imposição, inclusive a distração do  boi-de-piranha. De certo modo, para quê democracia quando o objetivo é legalizar interesses privados?

 

Aqui os relacionamentos são superficiais e se aprofundados tornam-se tóxicos, pois logo surge a contrariedade. Tem guerra até na sacristia. A convivência é difícil e leva à alienação ou à violência. Mesmo o silêncio é uma violência quando feito com barulho interno, frustração, revolta engolida e reprimida, que certamente espera a oportunidade de revanche.

 

Dizem que o país não é para amadores, tal a complexidade que se lhe atribui no entrelaçamento dos interesses, onde a grande maioria esmorece diante das iniquidades, mas alguns se aproveitam e são bem ativos. Talvez a democracia para poucos no mundo formal e bem produtivo.

 

A vitrine mais popular do exercício democrático é a vida política nas casas legislativas, pois é passível de cobertura televisiva, todavia, qual os cacos no caleidoscópio, onde lá lapsos de progresso, mesmo que a visão seja geral e superficial, cabendo a cada cidadão tirar sua impressão. Quanto ao processo democrático nas relações diárias dos interesses comezinhos, o processo é muito mais tosco e rude, marcado pelo encontro entre egos e geralmente resolvido na imposição e violência física e moral.

 

Eis a democracia em seu berço, choramingando, mas com muito a vencer. Dizia Nelson Rodrigues, que o Brasil conhecerá a selvageria antes da civilização. Talvez radical, mas verdadeiro. Do índio ao astronauta, ainda temos muitas realidades democráticas sofríveis, mas em avanço. É a fase de transição do rural para o urbano, do rude para o sutil. Pode levar muitas dezenas de décadas.

 

Duro de ver, de aguentar, de pensar, mas é a etapa do processo. Aguentemos,  pois já foi bem pior. Hoje vemos o roto perseguindo o esfarrapado pelos caminhos da vida medíocre, mas ambos pensando ser a expressão mais elevada da rua ainda em macadame e barro.

 

Ad astra per áspera. Aqui o debate, perguntas, pedidos de esclarecimento,   discussão é sinônimo de oposição, preparada ou não, sendo punida com cancelamento, seja lá onde for. Mas a democracia, mesmo assim, é a melhor via. Aqui está ainda lactente. Vamos fazê-la crescer e prosperar no tempo, pelos tempos e com o tempo. Não há alternativa melhor.

 

É então, a democracia que estamos construindo, a democracia na base social , nas relações pessoais, nas  situações do dia a dia onde há interesses diversos, e feita, muitas vezes, com a linguagem não adequada, mas expressão do povo que temos e sua educação deficitária.

 

Essa realidade aparece no discernimento  político e geral. O elemento  humano é na grande maioria da mesma base e alimenta a direita, a esquerda e o centro com o mesmo fundo de preparo e despreparo.  

 

Milhares de exemplos poderiam ser citados. Desnecessário, pois é o dia a dia do condomínio, da vizinhança, da Câmara à Assembleia, desta ao Congresso,  da escola à Faculdade. Em tudo, aparece o rude, o bruto, a inflexibilidade, a intolerância, o radicalismo, a intransigência nas relações humanas.

 

É a fase em que estamos, aguentemos um dia passa, passamos.  

 

 Odilon Reinhardt-3.10.25

  

 

   

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